segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Parte XIV



Bonfim e a água
Em fevereiro de 1831, por divisão das freguesias da Sé, Santo Ildefonso e Campanhã, foi autorizada a criação da freguesia do Bonfim, sancionada mais tarde, em dezembro de 1841, por decreto de Costa Cabral. Esta freguesia desenvolveu-se à volta do Monte das Feiticeiras, onde se construiu o cruzeiro do Senhor do Bom Fim e da Boa Morte e que é, atualmente, ocupado pela Igreja de Bonfim. A freguesia incluía a área que envolvia a urbe do Porto e por onde passavam os caminhos que dela se dirigiam para Gondomar, para Valongo e daí para Trás-os-Montes, passando por Penafiel e Amarante.
A freguesia do Bonfim foi o lugar eleito para a instalação de um grande número de fábricas que a transformaram, a partir de meados do séc. XIX, como o principal pólo industrial do Porto, na qual predominava a indústria têxtil. Com a chegada do comboio à estação de Campanhã, a cidade passou a receber uma mole humana que procurava fugir à pobreza dos campos e era atraída pela perspectiva de uma nova e melhor vida. Tantos foram que os salários baixaram, o desemprego subiu e a habitação escasseou. A miséria instalou-se no Porto e arredores num período que devia ter sido de melhoria da qualidade de vida. Expandiram-se então as ilhas, forma precária de habitação. Pequenas casas com reduzido pé-direito, com o mínimo de divisões, com luz e ventilação escassas, sem água potável e com retrete comum, por vezes com poço não muito longe da latrina. Melhor definição de “ilha” como a de Ricardo Jorge não conhecemos, que cruelmente dizia: “São renques de cubículos, às vezes sobrepostos em andar, enfiados em coxia de travesso. Este âmbito, onde se apilham camadas de gente, é por via de regra um antro de imundície; e as casinhas em certas ilhas, dessoalhadas e miseráveis, pouco acima estão da toca lôbrega dum troglodita” (Jorge citado em Pinto 2012: 13)[1]. Esta miserável forma de viver fez com que a freguesia apresente, no final do século XIX, valores da mortalidade superiores a 30‰ (Pinto, 2012: 6).
Para além da classe operária, também se dirigiram para a área de Bonfim industriais e comerciantes, alguns deles brasileiros de torna-viagem, que construíram alguns palacetes e deram origem ao rasgar de novas ruas e avenidas no lugar onde existiram importantes quintas como a de Cirnes, antes do Reimão. O palácio desta quinta foi comprado pela Junta de Freguesia em 1880, que ainda o ocupa. Muitos desses «brasileiros» investiram largas somas de dinheiro na freguesia, não só nas suas habitações, mas também nas fábricas de tecelagem e cerâmica e em melhoramentos infra-estruturais. Há alguns anos que as fábricas da freguesia fecharam as suas portas, dando lugar a outras atividades económicas, tais como o comércio e a restauração, o ensino e a saúde, as instituições bancárias, as pequenas empresas, os serviços e o turismo. Esta pujante atividade dos nossos dias tem funcionado como impulsionador da recuperação de uma boa parte dos edifícios da freguesia do Bonfim, enriquecendo a cidade do Porto.
A freguesia de Bonfim ocupa uma área de 3 km2. O crescimento populacional da freguesia do Bonfim na segunda metade do século XIX foi explosivo, tornando-se, em 1890, como a freguesia mais populosa do Porto com 22 512 habitantes, posição que manteve até 1930. No último recenseamento, o de 2011, a população residente na freguesia do Porto era de 24 265, dos quais 10 674 homens e 13 591 mulheres, ocupando o quarto lugar atrás de Paranhos, Ramalde e Campanhã.
Figura 1 – limites da freguesia. Fonte: http://www.jfbonfim.pt/Mapas-da-Freguesia, descarregado em 12/11/2018

O Vale de Bonfim, descrito na Parte 5, sempre foi rico em água que se acumulava em mananciais que alimentavam uma boa parte das fontes das freguesias da Sé, Santo Ildefonso, Bonfim e Campanhã. Para além do Manancial de Mijavelhas que terá desaparecido e substituído no uso da água pelo do Campo Grande, foram identificados o de Montebelo e algumas minas que abasteciam a Arca do Campo Grande que partilhava a água com a freguesia de Santo Ildefonso, os mananciais do Bispo ou Mitra, o das Freiras, o da Cavaca, o da Aguardente ou Marquês de Pombal, e o manancial das Fontainhas, o primeiro a alimentar a antiga urbe. Muitas das fontes desta freguesia foram referidas em capítulos anteriores: Fontainhas (Parte 2), Canavarro ou Segunda Fonte de Santa Catarina,  Marquês de Pombal, Exterior e Interior do Prado Repouso  (Parte 5)  e Firmeza (agora na Praça das Flores da freguesia de Campanhã), S. Jerónimo ou Largo da Póvoa, Padrão de Campanhã, Padrão ou Santo Ildefonso e Fonte Seca ou Terceira Fonte de Santa Catarina (Parte 6).


Figura 2 - Planta do Aqueduto de Mijavelhas entre a Capela de Santo André e a Rua do Senhor do Bonfim, desenhada por Theodoro de Souza Maldonado e aprovada pela Junta de Obras Públicas em 1795-06-11. Legenda: A – Capela de S. André; B – Rua Direita de Santo Ildefonso; C – Campo de S. Lázaro; D - Rua de Reimão; E – Ponte das Patas; F – Arca d’Água, donde parte o aqueduto com o n.º 4 que atravessa a ponte no ponto y, e entra na cerca dos Antoninhos (Convento de Santo António) no ponto a, e vai ao Campo de S. Lázaro atravessando o convento no ponto b, onde tem um braço para o Colégio das Órfãs, e continua até C onde tem outro para a fonte Z. Pode melhorar-se o aqueduto fazendo-o descrever a linha n.º 2 atravessando o ribeiro no ponto K mais estreito e com as precauções necessárias, tornando a seguir a linha do velho no ponto h até S, e daí continuar pela travessa e campo até c, deixando um braço para o Colégio das Órfãs no ponto L; G – Rua do Senhor do Bonfim. Descarregado em 12/4/18 de https://goo.gl/LJDhuu.

Das fontes e chafarizes ainda não identificados é justo fazer uma referência especial ao Chafariz de Mijavelhas, mais tarde Fonte do Campo Grande (Velasques, 1991: 194). Esta fonte, de mergulho ou chafurdo, terá sido construída antes de 1384 e alteada, poucos anos antes de 1548, com a construção de uma arca e pavimentação da área envolvente. Foi desta arca que, em 1633, a sua água foi levada até à Fonte da Rua Chã. Em 1819, a arca foi transformada em reservatório arcado, sendo este o que foi reconstruído na estação de metropolitano do Campo 24 de Agosto. Mais modesta era a desaparecida Fonte do Caes, que esteve no muro da Quinta da China, junto ao rio Douro à beira da Estrada Marginal, atual Avenida Paiva Couceiro. Brotava de mina própria, saindo por um pequeno pedestal de pedra e caindo numa pia de modo a que os animais a usassem (Velasques, 1991: 193 -194).
A Fonte da Rua da Alegria, que esteve instalada na Rua que lhe deu o nome, recebia a água do Manancial da Praça do Marques de Pombal que a despejava num tanque existente nas suas traseiras com capacidade para servir de apoio aos incêndios em caso de necessidade. Era este tanque que alimentava uma única bica da fonte e a lançava para um tanque maior e central e deste para dois tanques laterais. A fonte pertenceu aos Padres Congregados do Oratório de S. Filipe (Santo Ildefonso).

Figura 3 - A Fonte da Rua da Alegria (Bahia Júnior, 1909: 42)



Figura 4 - O tanque que se encontrava nas traseiras da Fonte da Rua da Alegria. Este tipo de tanques eram importantíssimos para o combate aos frequentes incêndios que ocorriam no centro da cidade. JBJ pág. 42

A Fonte do Seixal localizava-se na Travessa do Seixal, hoje Rua Aurélio de Sousa. Na realidade era um poço protegido com uma bomba de acionamento manual. A água da bica era recebida por um recipiente ou, então, seguia para o tanque lavadouro. Quando havia água com abundância, o nível do poço subia e acabava por sair pela bica, tornando desnecessária a bomba. Embora protegido por uma porta de acesso, a água do poço sofria da contaminação da libertação urinária e descarga fecal, muito frequente junto à fonte. Como resultado das evidentes contaminações, a qualidade bacteriológica água era considerada como má (Bahia Júnior, 1909: 49; 26).


Figura 5 - Fonte do Seixal (Bahia Júnior, 1909: 49)

Desconhecida da grande maioria dos tripeiros, apesar de se encontrar numa das ruas mais movimentadas do Porto, a Fonte da Rua da Prata está inserida no muro de suporte do morro da Igreja do Bonfim, esquecida entre expositores de publicidade e a vegetação que cresce nas juntas do paredão. Terá sido inicialmente instalada na Rua do Godim, antiga Rua da Prata, muito próximo da estrada que seguia para Valongo, hoje Rua do Bonfim. Dela apenas resta a passagem da sua bica da qual ainda se pode ver um pedaço do tubo de aço, e um pilarete para colocação do vasilhame que se enchia de água. O que era ferro desapareceu pela ação do vandalismo que tem atacado as fontes e chafarizes do Porto. Bahia Júnior, 1909, descreve o Charco de Godim situado ”ao fim da rua do mesmo nome, dentro de um dique de pedra e terra colocado no encontro das duas ruas que aqui se juntam, ambas de declive muito rápido”. Este dique retinha a água por vezes debitada pela mina e a água que escorria, quando chovia, das duas ruas. Facilmente se depreende que a água do charco era de muito má qualidade, mas os habitantes da área não tinham outra alternativa. Pela fotografia que reproduzimos depreende-se que o charco nada tem a ver com a Fonte da Rua da Prata.

 Figura 6 - A Fonte da Rua da Prata perdida e abandonada num paredão da rua do Bonfim

Figura 7 – A simplicidade da Fonte da Prata adaptava-se à sua função, servir os que passavam

Figura 8 - O dique do charco de Godim, seco quando da visita de J. Bahia Júnior. Foto da sua dissertação, na pág. 49

A Fonte da Lomba, situada na rua do mesmo nome que liga a Rua do Heroísmo à Rua de Pinto Bessa, é descrita por J. Bahia Júnior. A água que a abastecia a sua bica nascia a cerca de 25 m da fonte, no meio de um campo cultivado. Da bica, a água caía numa pia donde seguia por uma caleira que a conduzia ao tanque lavadouro. A qualidade bacteriológica da água da mina e da fonte era considerada como boa, exceto quando chovia porque sofria o efeito das contaminações (Bahia Júnior, 1909:103).

Figura 9 - Fonte da Lomba. J. Bahia Júnior, pág. 48

Velasques faz referência à Fonte da Boavista que terá sido localizada na Rua das Antas, recebendo a água da Quinta do Fojo (Velasques, 1991: 191). Infelizmente, não encontrámos outra referência a essa fonte e muito menos à Quinta do Fojo, próximo da Rua das Antes. A mais próxima chamou-se de Quinta das Lameiras que hoje é o Parque de São Roque.

Paranhos e a água
Paranhos é conhecida, pelo menos desde o século X. A freguesia de S. Veríssimo de Paranhos fez parte da Terra da Maia (Marçal, 1954: 1)[2]. Era um conjunto de casais dispersos, com alguns caminhos que convergiam para as portas da cidade do Porto. Dois deles eram muito importantes: a estrada para Guimarães, que saía da Porta dos Carros e passava pela Rua do Bonjardim, e lugares da Aguardente (Praça do Marques de Pombal) e da Cruz da Regateira, lugar que existia na área onde foi construído o Hospital Conde Ferreira, inaugurado em 1883; da Porta do Olival, seguia-se para o Sério (Rua Antero de Quental), pela Rua de Santo Ovídio (depois Rua da Sovela e, hoje, Mártires da Liberdade), ou para o Carvalhido, pela Rua de Cedofeita. O primeiro caminho dirigia-se para Braga, enquanto o segundo seguia para Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Viana do Castelo (Marçal, 1954: 2).
Com o desenvolvimento do burgo do Porto, no século XVII a sua população teve que procurar pouso fora dos muros da cidade, começando a surgir quintas e prédios ao longo das estradas que se iam formando. Na sequência da incorporação no concelho do Porto, em 1836, das freguesias de Campanhã, Lordelo do Ouro e S. João da Foz do Douro, a Câmara Municipal do Porto apresentou ao Governo um pedido para que a freguesia de S. Veríssimo de Paranhos fosse anexada à cidade, o que aconteceu em setembro de 1837. Em finais do século XIX, a freguesia de Paranhos mostra um crescimento lento, no qual se distingue a abertura de duas importante ruas:  a da Rainha, atual Antero de Quental e Vale Formoso, e a de Costa Cabral, que seguem as antigas vias de acesso, respetivamente, a Braga e a Guimarães.
No início do século XX, Paranhos  era um aprazível local dos arrabaldes da cidade do Porto, onde existiam belas quintas e casas de habitação. O seu fértil terreno permitia o cultivo de muitos géneros agrícolas, fazendo que as casas de lavoura fossem durante mais algumas décadas a mais importante atividade económica da freguesia. Entretanto, a indústria começou a ganhar alguma importância com a fundação de algumas fábricas de tecidos, curtumes, etc., mas nunca teve a expressão que foi sentida na freguesia de Bonfim.
Atualmente, a freguesia de Paranhos com 6,7 km2 de área, é limitada, a nascente, por Campanhã, a sul, por Bonfim, Santo Ildefonso e Cedofeita, a oeste, por Ramalde, e a norte fazendo fronteira com as freguesias de S. Mamede de Infesta (Matosinhos), Pedrouços (Maia) e Rio Tinto (Gondomar). No ano de 1623 a freguesia de Paranhos tinha 246 habitantes, passando, em 1867, para 466 almas de confissão, segundo as Constituições Sinoidais do Bispado, citadas por Marçal, 1954: 58. Em 1864 apenas era de 3.309 habitantes. Tinha, pelo Censo de 1950, 37.507 habitantes. Em 1991 tinha 50 906, em 2001 48 686 e, em 2011, 44 247, sendo a freguesia mais populosa do Porto.
Depois de Paranhos ter ganho, em 1883, um hospital, o de Conde Ferreira, nos primeiros anos da década de 1950 construiu-se no Lugar da Asprela aquele que começou por ser o Hospital Escolar da Cidade, com a Faculdade de Medicina virada para a Estrada da Circunvalação. Hoje, aquela área está ocupada com importantes unidades de ensino superior e instituições hospitalares. Entre estudantes, professores, técnicos de saúde, doentes e visitantes, para ali se deslocam diariamente mais do que 50.000 pessoas.

Figura 10 - O território da freguesia de Paranhos. Fonte: Junta de Freguesia de Paranhos, mapa descarregado em 18/11/2018 de https://goo.gl/a5bniE

A freguesia de Paranhos é rica em água que se acumula, devido à orografia, nas suas profundezas, destacando-se os importantes mananciais de Paranhos e Salgueiros, que foram descritos na Parte 9, cujos aquedutos transportavam a sua água para o centro da urbe. Paranhos possui alguns regatos de pequena dimensão utilizados outrora pelos lavradores para regarem os seus terrenos de cultivo, pois esta freguesia, no século XIX e inícios do século XX era essencialmente uma terra de cariz rural. Horácio Marçal caracteriza hidrograficamente a freguesia de Paranhos, começando por afirmar que ela, “em rigor, não tem rios ou afluentes, muito embora chame rios a alguns regatos que possui, os mais conhecidos são o das Barrocas, o da Azenha, o da Manga e o da Travessa” (Marçal, 1954: 26-27). Os nomes destes “regatos” não correspondem aos atualmente conhecidos. A Ribeira da Manga, que corresponde à Ribeira da Asprela, resulta da reunião do Rego de Consortes, que pode equivaler à Ribeira de Outeiro, com o da Azenha, que pode ser a Ribeira da Areosa. O regato das Barrocas deve corresponder a um dos riachos, o que nasce na rua da Fonte do Outeiro, que origina a Ribeira do Outeiro. Não encontrámos qualquer informação sobre a localização dos regatos da Azenha e Travessa. Podemos admitir que a construção dos edifícios escolares e hospitalares que ocupam o espaço entre os lugares da Azenha e Asprela modificaram o percurso dos regatos registados por Horácio Marçal. Caso semelhante ocorre durante a instalação da linha Amarela do Metro do Porto. Segundo Marçal, 1954, os ribeiros mais conhecidos foram os das Barrocas, o da Azenha, o da Manga e o da Travessa. Num documento do século XI, reproduzido por Horácio Marçal, 1954: 27, fazia-se referência ao Rio Paramio que não terá sido nenhum dos atrás referidos.
A da Ribeira dos Currais, afluente do Rio Tinto, tem a sua nascente, nas alturas de Currais (monte dos Murganhos) e do monte das Antas, e parte do seu percurso na freguesia de Paranhos. O mesmo acontece com a Ribeiro de Picoutos e a Ribeira dos Amores. O de Picoutos nasce junto à Igreja dos Capuchinhos, no Amial, atravessa a Estrada da Circunvalação e segue para se encontrar com o Rio Leça. A ribeira dos Amores  nasce na freguesia de Paranhos e segue em direção ao concelho da Maia. Afluente do Rio Leça, esta ribeira tem uma extensão de, aproximadamente, 790 m no concelho do Porto, encontrando-se, neste troço, totalmente entubada.
A ribeira da Asprela, também afluente do Rio Leça, tem vários afluentes que nascem no concelho do Porto, na freguesia de Paranhos. Esta linha de água apresenta, na cidade do Porto, uma extensão de aproximadamente 3,7 km (Fernandes, 2009: 28). A ribeira da Asprela encontra-se maioritariamente entubada, com apenas 36% a céu aberto. Uma das primeiras ações de reabilitação de linhas de água da cidade do Porto ocorreu num troço do ribeiro do Outeiro junto do Bairro do Outeiro. Em 2014, a Universidade do Porto deu início ao desentubamento e reabilitação de um troço entre as Faculdades de Engenharia e Economia. Está previsto o desentubamento e reabilitação de um troço da ribeira da Asprela junto do Instituto Português de Oncologia (IPO), o que aconteceu, até 2018, num pequeno troço.
A ribeira da Asprela resulta da reunião de quatro linhas de água, a saber:
1.   Ribeira da Areosa – segundo Neves, 2009: 31, esta ribeira nasce a nascente da auto-estrada A3, na zona da Escola E/B 2/3 da Areosa e traseiras da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP). É importante para recolher as águas pluviais que drenam da A3, FEUP e outras instalações. Esta ribeira percorre um canal em betão, em parte aberto, localizado entra a FEUP e a Faculdade de Economia, encontrando-se a céu aberto depois de atravessar a rua Dr. Roberto Frias e até à sua junção com o Ribeiro do Outeiro, nas traseiras da Faculdade do Desporto da Universidade do Porto. Em 2001, as seis amostras recolhidas por Paula Reis, entre julho e outubro, no troço imediatamente antes daquela sua reunião, apresentavam valores da CQO entre 15 e 93 mg/L O2 (Reis, 2002). Os resultados mostram que esta a ribeira está contaminada, mas numa escala inferior à da maior parte das linhas de água do Porto. Mesmo assim, a sua água foi classificada como má pelo Índice de Qualidade Geral.

Figura 11 – A Ribeira da Areosa, num período seco (2018), no percurso ao lado da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

Figura 12 – A Ribeira da Areosa, num período de chuva (Janeiro de 2019), no mesmo percurso

2.   Ribeira do Outeiro – este curso de água resulta da reunião de dois riachos, um dos quais nasce na rua Fonte do Outeiro, nas traseiras do Hospital Conde Ferreira, atravessa a A3 e junta-se ao outro riacho que nasce a sul da Via de Cintura Interna, VCI,I na rua Dr. Pires de Lima, segue canalizada ao longo das Ruas Augusto Lessa, Vitorino Damásio e Luís Woodhouse, caindo num lavadouro público e daí seguindo em aqueduto ao encontro da ribeira do Outeiro. Na entrada deste aqueduto chegam dois tubos de razoável dimensão com águas aparentemente residuais, cuja origem desconhecemos. Esta ribeira junta-se à da Areosa depois de atravessar a rua Dr. Roberto Frias, dando origem à ribeira da Asprela. O estudo realizado por Paula Reis permite verificar que esta linha de água apresentava uma carga poluidora semelhante à da ribeira da Areosa, tendo sido classificada como de má qualidade.

 Figura 13 – Lavadouro da Rua Prof. Mendes Correia que recebe água do ramo da Ribeira do Outeiro que nasce no lado sul da VCI

Figura 14 – Aqueduto do ramo sul da Ribeira de Outeiro que atravessa a VCI. Dois tubos de importante diâmetro alimentam o mesmo aqueduto. Sublinhe-se que o dia em que se realizou a foto foi antecedido por um largo período sem chuva. A descarga do tubo da direita, semelhante à do tubo da esquerda, tem características físicas que merece uma pergunta: qual é a sua origem?

Figura 15 – Percurso do ramo norte da VCI da Ribeira de Outeiro

3.   Ribeira de Paranhos – nasce na rua de Augusto Lessa, abastece o lavadouro público situado nas traseiras da Escola Preparatória de Paranhos, e segue, canalizada, em direção à Faculdade de Medicina Dentária. Após esta instituição, desagua na ribeira da Asprela. Em 2001, a água desta ribeira, com valores da CQO entre 163 e 499 mg/L O2, era equivalente a esgoto doméstico (Reis, 2002). A autora classificou a água deste ribeiro como má/péssima.

Figura 16 – Reunião do Ribeiro do Outeiro com a da Areosa

Figura 17 – A Ribeira da Asprela nas traseiras da Faculdade do Desporto da Universidade do Porto

Depois de receber as três ribeiras atrás descritas, forma-se a ribeira da Asprela. Embora no troço que rodeia a Faculdade do Desporto (FADEUP) a ribeira não esteja coberta por betão ou material equivalente, a vegetação é tão intensa e densa que ela não se vê facilmente. Depois de atravessar a Rua de Roberto Frias, a ribeira passa, entubada, no Instituto Superior de Engenharia e Universidade Portucalense, e sai nas traseiras do Instituto de Oncologia onde vê o Sol e as Estrelas em poucas dezenas de metros. Regressa ao subsolo que foi ocupado por mais um conjunto de prédios de habitação até atravessar a Estrada da Circunvalação. A partir daí, segue em canal aberto em direção ao Rio Leça. Já acima foi referido que as ribeiras da Areosa e do Outeiro mostravam, em 2002, contaminação com águas residuais. Esta situação mantém-se na Ribeira da Asprela. O estudo realizado, em 2007, por Nívea Vieira (Vieira, 2007: 91-93) comprova que a contaminação era de origem doméstica, como o confirmam as concentrações de nitratos, nitritos e azoto amoniacal.

Figura 18 – A Ribeira da Asprela nas traseiras da Faculdade do Desporto da Universidade do Porto

Figura 19 – A Ribeira da Asprela nas traseiras do Instituto Português de Oncologia

Figura 20 – A Ribeira da Asprela, depois da Estrada da Circunvalação, despedindo-se do Porto e correndo para abraçar o Rio Leça

Para além dos mananciais de Paranhos e Salgueiros que abasteceram a cidade através de muitas fontes descritas no capítulo 9, a freguesia de Paranhos possuía também o manancial do Marques de Pombal que alimentou as fontes da Rua da Alegria e a Fonte Seca da Rua de Santa Catarina. A primeira fonte pertencia aos Padres Congregados do Oratório de S. Filipe. A segunda era assim chamada porque foi reconstruída no lugar onde existiu outra que ficou sem água durante mitos anos até 1852. A Fonte da Rua da Alegria é referida atrás por ter pertencido à freguesia do Bonfim.
Segundo Souza Reys, a freguesia de Paranhos tinha água abundante e de excelente, qualidade, sem que se pudesse separar alguma por ser sofrível ou má, era abastecida por dez fontes, poços e cisternas públicas. Os poços eram três, um na aldeia de Lamas, a Fonte ou Poço da Aldeia de Lamas, outro chamado de Fonte da Bouça, e um outro localizado na Cruz da Regateira (Souza Reys, 1984: 198). Este autor apenas considerava cinco fontes: do Outeiro, do Salgueiral, do Vale e da Manga: Horácio Marçal, 1968 acrescentava àquela lista as Fontes de Baixo, da Aldeia de Lamas, da Travessa, da Cruz da Regateira, que pode ser o poço referido por Souza Reys, e a das Barrocas. Com exceção desta última, que tinha duas bicas, todas as restantes não passavam de cisternas onde a água fresca e saborosa era colhida pelo processo de mergulho de cântaros, e de poços ou comuns. As vertentes da maioria delas corriam para os campos dos lavradores vizinhos e abasteciam também alguns lavadouros.
A Fonte das Barrocas tinha duas bicas. Provavelmente, localizar-se-ia próximo da rua de Costa Cabral, a norte do Hospital Conde Ferreira, na rua ou travessa das Barrocas. A Fonte do Vale, no lugar do Vale (Velasques, 1991: 230) e a Fonte do Outeiro e respetiva cisterna localizavam-se na rua que recebeu o nome da fonte. Para além desta cisterna existiam mais quatro na freguesia de Paranhos: Fonte de Baixo, Fonte do Salgueiral, Fonte do Vale e Fonte da Manga no lugar da Manga. A Fonte da Manga, que deu o seu nome ao Lugar da Fonte e ao Casal da Fonte foi, em 1593, registada nos bens pertencentes ao Cabido. Horácio Marçal acrescenta a esta lista a Fonte/cisterna de Baixo, no Lugar de Baixo e o Poço da Cruz da Regateira, no lugar do mesmo nome, onde a população se abastecia. A água provinha do manancial de Paranhos (Marçal, 1954: 49:51, Marçal, 1968; 22, Souza Reys, 1984: 198, Velasques, 1991: 211 - 218)(Velasques, 1991: 201).

Figura 21 – O fontanário da Rua da Fonte do Outeiro, alimentado com água da companhia. Ele substituiu a fonte que deu nome à rua

Nesta freguesia havia uma nascente que alimentava uma fonte de bica, e os seus lavadouros, de nome Fonte da Azenha (Souza Reys, 1984: 198). Horácio Marçal teve sérias dúvidas que a água desta fonte tenha corrido por uma bica. Velasques localizou-a na rua da Azenha, que une a rua do Amial à de S. Tomé. Existia outra nascente que formava um rego volumoso cuja água era usada para uso doméstico dos habitantes próximos e que se chamava Fonte da Travessa. Este rego também alimentava os lavadouros da rua da Travessa (Souza Reys, 1984: 198, Velasques, 1991: 226). A Fonte da Bica Velha foi construída em 1718 na Travessa da Bica Velha. Em 1896 foi transladada para a Rua da Nataria, adotando, então, este nome (Velasques, 1991: 189). Na área Quinta do Covelo, construída no século XVIII e há muitos anos em ruínas, existiu uma fonte denominada do Covelo na Revisão do PDM de 2018[3] que está descrita num documento de 1440. A Fonte das Fressureiras, apresentava água de boa qualidade bacteriológica em 1905 (Bahia Júnior, 1909: 24). O mesmo autor encontrou-a seca na avaliação que fez em 2008.

Continua...





[1] Pinto, Jorge Ricardo, 2012, A expansão (sub)urbana no Porto romântico. O caso da Freguesia do Bonfim, Percursos & Ideias, n.º 3&4 – 2.ª Série, 2011-2012.
[2] Marçal, 1954, H., S. Veríssimo de Paranhos (freguesia da cidade do Porto) – Subsídios para a sua monografia, Documentos e Memórias para a História do Porto – XXV, Publicação do Gabinete de História da Cidade da Câmara Municipal do Porto.
[3] Revisão do Plano Diretor Municipal do Porto, 2018, Valores Patrimoniais – Mobiliário Urbano e Obras de Arte Pública, Relatório de Caracterização e Diagnóstico, Câmara Municipal do Porto.