sexta-feira, 21 de junho de 2019

Parte XV





ANTIGA FREGUESIA DE SANTO ILDEFONSO


Com o aumento da população dentro dos muros, a cidade do Porto estendeu-se para fora do recinto da muralha, resultando daí, em meados do século XVIII, mais duas paróquias: Miragaia e Santo Ildefonso. Embora o arrabalde de Santo Ildefonso, extramuros, fosse muito mais antigo, a freguesia com esse nome foi criada em 24 de junho de 1634, à data com 1790 almas, que tinha como limites: a poente, Miragaia e Couto de Cedofeita; a norte, o Campo de Santo Ovídio e o Couto de Paranhos; a nascente, era limitada por Campanhã; a sul, o limite ia da Porta da Batalha até ao Calvário Novo; daquela Porta caminhava para poente ladeando a muralha Fernandina até ao assento das Virtudes. Dada a desigual distribuição de áreas e de população, esta freguesia, de enorme território, foi desmembrada, em 1841, por um decreto de Costa Cabral que fundava a nova freguesia de Bonfim.
Com data de 8 de Fevereiro de 1956, foi publicado um Decreto assinado por Francisco Higino Craveiro Lopes (Presidente da República), António de Oliveira Salazar (Presidente do Conselho de Ministros) e por Joaquim Trigo de Negreiros (Ministro do Interior) e com o número 40 526 que estabelecia a nova delimitação das freguesias do concelho do Porto. No que a Santo Ildefonso diz respeito, o texto da sua delimitação era o seguinte: com início na Avenida de Rodrigues de Freitas, no cruzamento com a Rua de S. Vitor (vértice comum às três freguesias: Santo Ildefonso, Bonfim e Sé), segue pela Rua de D. João IV até à Rua da Firmeza, Rua da Firmeza, para poente, até à Rua da Alegria, Rua da Alegria, para norte, até à Rua da Escola Normal. Rua da Escola Normal, Rua de Santa Catarina para norte, arruamento nascente da Praça do Marquês de Pombal. Rua da Constituição, para poente, até à Rua de S. Brás e por esta rua, para sul, até à Rua do Paraíso, Rua da Regeneração, arruamento nascente da Praça da República. Rua do Almada até à Rua de Ricardo Jorge, onde fica o vértice comum às três freguesias: Cedofeita, Santo Ildefonso e Vitória. Rua do Almada, para sul, até à Rua dos Clérigos, onde fica o vértice comum às três freguesias: Vitória, Santo Ildefonso e Sé, seguindo, para nascente, pelo arruamento sul da Praça da Liberdade. Praça de Almeida Garrett, Rua da Madeira até à Praça da Batalha e deste ponto até à parede divisória dos prédios n.os 19 e 20 da Praça da Batalha e daqui, contornando a propriedade do Teatro Águia de Ouro, até junto ao cunha sudoeste do prédio n.º 1 da Rua de Entreparedes. Rua de Entreparedes, para nordeste, e Avenida de Rodrigues de Freitas até à Rua de S. Vitor.
Em 2012, deu-se a reorganização administrativa do território (Lei n.º 22/2012, de 30 de maio) levando a freguesia de  Santo Ildefonso a juntar-se às de Cedofeita, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória para formar uma União.

 Figura 1 – Mapa da freguesia de Santo Ildefonso. Fotografado de Google maps, https://goo.gl/S4x31U, em 24/2/19.

Santo Ildefonso, freguesia essencialmente urbana, foi enriquecida, a partir do século XVIII, com alguns lugares emblemáticos do Porto: As praças da Batalha e dos Poveiros, e as conhecidas ruas de Santa Catarina, 31 de Janeiro, Passos Manuel, Sá da Bandeira, etc, e alguns locais de visita obrigatória para os turistas como o são o Mercado do Bolhão, atualmente em remodelação, “A Brasileira”, antigo café que sofreu enorme benefício e agora é restaurante e hotel, o café Magestic, inaugurado em 1921, a Capela das Almas cujos azulejos das paredes exteriores são dos mais fotografados do país, a Igreja da Trindade, os Paços do Concelho e, claro, a avenida dos Aliados, sala de visitas do Porto, que se estende aos pés daqueles Paços.
Em 1623, D Rodrigo da Cunha fez a primeira contagem conhecida da população de Santo Ildefonso, adiantando os seguintes números: 1150 habitantes, dos quais 150 eram menores. Nos séculos XVII e XVIII o crescimento da população desta freguesia foi notável. Por exemplo, a população aumentou de 22.714, em 1732, para 46.404 habitantes, em 1789. Não admira, por isso, que, em 1841, tenha sido criada a freguesia de Bonfim com uma boa parte do território de Santo Ildefonso, passando, este, a ocupar a área de 1,2 km2, onde habitavam, em 2011, apenas 9.029 pessoas (decréscimo de 37,7% na população entre 1991 e 2011), com o índice de envelhecimento[1] de 309, muito superior ao do concelho de Porto, 195, e ao do país, 129.
A freguesia de Santo Ildefonso ocupa dois naturais vales secundários responsáveis pela existência de importantes reservas de água. Um, o de Fradelos, com início na rua da Fontinha, situa-se entre os montes dos Congregados e da Fontinha; o segundo, a que muitos chamaram de Germalde, orienta-se por entre as ruas de Bonjardim, Camões, passa pela Trindade e junta-se ao primeiro na atual Praça da Liberdade; este vale recebe a vertente oriental do monte da Lapa e a ocidental do monte da Fontinha. As duas linhas de água definidas nos dois vales levam a água até à sua confluência, formando o mais importantes rio que percorria o Porto antigo – o Canal Maior ou rio da Vila. A expansão e o desenvolvimento urbanístico da cidade do Porto escondeu, em parte, esta realidade ocultando a água e planificando o relevo. A impermeabilização do solo, em grande parte ilegal, apressou a viagem da água pluvial para o Douro, empobrecendo os mananciais ou fazendo com que eles tenham, pura e simplesmente, desaparecido. A construção de caves e garagens em profundidade agravou a situação, fazendo desaparecer minas e poços. Esta prática continua desgraçadamente a acontecer.
Os mananciais do Largo da Aguardente (Marquês de Pombal) e Camões e nascentes próprias alimentaram um bom número de fontes que serviam a população da freguesia e quem nela passava. Algumas recebiam a água de mananciais das freguesias vizinhas, destacando-se o de Mijavelhas. No capítulo 4 descreve-se a Fonte da Porta dos Carros que recebia a água de uma nascente sita na Calçada da Teresa. No capítulo sexto descrevem-se as fontes e chafarizes da Batalha, do Terreiro da Batalha, da rua de Santo Ildefonso (Padrão das Almas), do Convento de Santo António da Cidade, do Jardim de S. Lázaro, da Viela das Pombas ou Primeira Fonte da Rua de Santa Catarina, do Canavarro ou a Segunda Fonte da Rua de Santa Catarina, a Fonte Seca ou Terceira Fonte da Rua de Santa Catarina, a da Natividade e a do Bolhão. O Chafariz de Camões ou da Feira dos Carneiros, a Fonte da Praça da Trindade, a Fonte do Hospital da Trindade, a Fonte da Rua do Laranjal, o Chafariz da Praça de D. Pedro, a fonte de Vila Parda foram descritas no capítulo 8. As fontes da rua de Sá da Bandeira, a dos Paços do Concelho e a Fonte do Olho do Cu (capítulo 8), eram abastecidas com água do manancial de Camões. A Fonte da Rua da Alegria, descrita no capítulo 14, recebia a água do manancial do Largo da Aguardente.
Na freguesia existiram, ou existem, mais fontes do que as que já foram descritas. Na praça de Gomes Teixeira existiu um chafariz com o nome do Colégio dos Meninos Órfãos que ficava no terreiro da Graça à beira da Igreja de Nossa Senhora da Graça que desapareceu, entre 1900 e 1905, para dar lugar à Praça Parada Leitão. Por sua vez, a fonte também foi substituída pela Fonte dos Leões. O Chafariz do Terreiro do Convento dos Lóios ou de Santa Maria da Consolação esteve instalado no largo dos Lóios[2]. No centro do Claustro deste Convento foi encontrada uma fonte ou chafariz que era alimentada por um tubo que atravessava uma das sepulturas aí existentes (Seabra, 2012: 21[3]). Deste chafariz a água era distribuída por diversas dependências do convento. Acrescente-se que no Largo dos Lóios existiu um pequeno lago circular de mau gosto, tanto assim que lhe atribuíram o nome de Alguidar dos Lóios, utilizado, segundo as más línguas, para “demolhar o bacalhau das sextas-feiras” (O Tripeiro, n.º 7, abril de 1926).
A construção da Fonte da rua da Fontinha ter-se-á iniciado em 1861 e terminado em 1866, em frente à travessa da Fontinha, para substituir a Fonte Seca sita na Rua da Bela Princesa, hoje a parte norte da Rua de Santa Catarina, que entretanto tinha ficado sem água. Era alimentada, por meio de uma canalização de chumbo, com a água da nascente localizada no largo da Fontinha. Em 1866, foi transferida para a rua das Carvalheiras de Cima e mais tarde, 1942, para o jardim do Porque de Nova Sintra. Esta fonte era simplesmente constituída por um pilar granítico, com uma bica que lançava a água para um pequeno tanque (figuras 2 e 3). A água desta fonte era de má qualidade. Não muito longe desta fonte encontrava-se a Fonte das Musas que foi construída em 1859 e esteve localizada defronte do chafariz de Vila Parda, na rua do Bonjardim. Rebelo da Costa, 1789, considerava que esta fonte servia água que, em bondade, seguia à de Paranhos que era “pura, claríssima, muito leve e desobstruente”. O padre Duarte Simão de Oliveira, citado por Teixeira, 2011, classificava-a como “tosca de boas águas, mas não muitas, no sítio de Santa Catarina”. Opinião contrária refletem os péssimos resultados das análises microbiológicas registadas por Bahia Júnior.


Figura 2 – A Fonte da rua da Fontinha, agora instalada no Parque de Nova Sinta

 Figura 3 – A Fonte da rua Fontinha instalada na dita rua (Fonte: J. Bahia Júnior, 1908:58)

A Fonte de Fradelos, construída em 1702, situou-se na parte alta da atual Rua Sá da Bandeira, na encosta sul do Monte de Fradelos, na travessa que ia da rua de Santa Catarina para a rua do Bonjardim. Essa travessa situava-se atrás do antigo quartel dos Bombeiros Municipais à rua de Gonçalo Cristóvão. Era uma fonte com pouca água, funda, e com lavadouros. As vertentes das fonte seguiam para a quinta dos Maias. A fonte ostentava no frontispício um nicho com a imagem de Nossa Senhora da Boa Hora (Marçal, 1968). De acordo com Bahia Júnior, era a mais imunda fonte de Santo Ildefonso, com o recinto coberto de bolos fecais. Tinha no seu frontispício a imagem de Nossa Senhora da Boa Hora. Velasques refere a existência de algumas pedras desta fonte junto da Igreja de Fradelos. Nascendo naquele monte, corria por ali um pequeno ribeiro, o de Fradelos, que desaguava, em frente da Igreja dos Congregados, no rio da Vila. A água desta fonte era, segundo J. Bahia Júnior, de má qualidade bacteriológica. A norte do lugar de Fradelos erguia-se o monte de S. João do Bonjardim que foi parcialmente desbastado para aí se construir a rua de Gonçalo Cristóvão.


Figura 4 - A Fonte de Fradelos onde se destaca a imundície (Fonte: J. Bahia Júnior, 1908:59)

O Chafariz ou Fonte Luminosa foi oferecida pela seguradora “A Confidente” e foi instalada, em 1966, na placa central da Praça de  D. João I. A fonte estava colocada no centro da rosa dos ventos desenhada no pavimento que indicava a direção norte –sul e era rodeada pelos símbolos do zodíaco. Quando da “reabilitação” daquela praça, a fonte foi dali removida e instalada, em 2006, na Praça do Marques de Pombal. A fonte tem um tanque circular com repuxo no centro cuja água, impulsionada por meio de uma eletrobomba, forma uma copa de água com forma cónica. Na mesma praça encontra-se também um espelho de água de estrutura retangular com um lado na forma de semi-círculo que se opõe ao espaldar onde se assenta um golfinho que lança, pela boca, a água que é reciclada do tanque por meio de eletrobomba.


Figura 5 – A Fonte que foi luminosa, agora instalada no jardim da Praça do Marques de Pombal



Figura 6 – Aspeto de uma das fases da construção da Fonte luminosa (Fonte: Arquivo Municipal do Porto, https://goo.gl/pPJYYj)


Figura 7 – O espelho de água do Jardim da Praça do Marques de Pombal. As pombas parecem esperar que a água chegue ao tanque.


ANTIGA FREGUESIA DE CEDOFEITA
A freguesia de Cedofeita terá nascido à volta da igreja românica de Cedofeita que pertenceu a um convento dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, sita no Largo do Priorado, provavelmente a mais antiga da cidade do Porto. Uma inscrição existente na frontaria da igreja dá o ano de 559 como o da fundação da igreja. Nessa data, a região compreendida entre Lisboa e o rio Minho era ocupada pelos suevos, associados aos visigodos, vândalos e alanos. A sua construção deveu-se ao rei suevo Teodomiro que se tinha convertido ao catolicismo. Como o edifício original se foi arruinando, sofre uma primeira restauração no século XII. A atual configuração da igreja resulta das alterações que lhe foram introduzidas em 1742. É interessante reconhecer que nesta igreja sempre a pratica cristão foi exercida, mesmo quando da ocupação mourisca mercê o consentimento dado através de uma “Carta de Jusgo” do seguinte teor: “Abdelassis Abhrem Mahomet, por illah illalah senhor da cidade do Porto, e da gente da Nazareth, pela qual ordeno que os Presbíteros e Cristãos do Mosteiro de Cedofeita que moram junto à dita cidade do Porto, e seu mosteiro possuam os seus bens em paz e quietação sem opressão, vexame ou força dos Sarracenos; com a condição que não digam Missas senão com as portas fechadas e não toquem as suas campainhas; e paguem pelo consentimento 50 pesantes de boa prata anualmente e possam sair e vir à cidade com liberdade e quando quiserem, e não vão fora das terras do meu mando sem meu consentimento e vontade; assim o mando; e faço esta carta de salvo conduto, e a dou ao dito Mosteiro para que a possua para seu sossego...»[4]. A última restauração da igreja concretizou-se em 1934.
O termo Cedofeita, especialmente o seu mosteiro, é citado na Bula do Papa Calisto II, de 1120, e a Carta de Doação de D. Afonso II, de 1218[5]. A integração do Couto de Cedofeita na urbe do Porto ter-se-á dado na transição do século XVI para o XVII, mas a integração formal deu-se, em 1710, por decisão da Mesa Grande da Relação a urbe foi estendida, para fora da muralha, para as freguesias de Vitória, Miragaia, Santo Ildefonso, Massarelos e Cedofeita.
Geograficamente, Cedofeita tem como limites os seguintes arruamentos: Rua de Miguel Bombarda, Rua de Diogo Brandão, Rua de Cedofeita (parte), Rua da Conceição, Rua do Dr. Ricardo Jorge, Rua do Almada, parte da Rua de Gonçalo Cristóvão, face leste e norte da Praça da República, Rua da Regeneração, Rua de São Brás, Rua da Constituição (parte), Rua de Cunha Júnior, Trav. do Monte Louro, Rua do Almirante Leote do Rego, Trav. e Rua de Ribeiro de Sousa, Rua do Padre Pacheco do Monte, Rua do Monte Alegre, Rua do Zambeze, Rua do Zaire, parte da Rua de Serpa Pinto, Rua de S. Dinis, Rua da Natária, Rua da Prelada e Rua de Pedro Hispano (até ao viaduto), Rua de 5 de outubro, Rua de Fernandes Costas, Praça de Mouzinho de Albuquerque, Rua de Júlio Dinis, Rua do Padre Cruz, Largo de Alexandre Sá Pinto, Rua da Torrinha, Rua da Boa Hora, Rua do Rosário, Largo da Maternidade e parte da Rua de Adolfo Casais Monteiro que chega até à Rua de Miguel Bombarda.


Figura 8 - Mapa da freguesia de Cedofeita. Descarregado de https://goo.gl/HU3oR3, em 3 de março de 2019.

Atualmente a atividade económica envolve, essencialmente, o comércio o turismo e a restauração. Nos últimos cinquenta anos a freguesia perdeu importantes estabelecimentos de ensino superior público, restando no território da freguesia apenas as Faculdades de Direito e de Farmácia. Em termos de equipamento, encontramos o Hospital Militar, o Hospital de Maria Pia e o Quartel General. População em 2011 – 22.022 habitantes. O índice de envelhecimento da freguesia, em 2011, era de 283, superior ao do concelho do Porto, 195.
A freguesia de Cedofeita desenvolve-se por um planalto que recebe as águas que descem pelo subsolo e superfície de encostas dos montes Pedral, Ramada Alta e S. Brás, reunidas em dois talvegues que definiram dois ribeiros já descritos nos capítulos 3 e 7, o denominado rio Frio e a ribeira de Massarelos. O primeiro nascia na área limitada pelas ruas da Boa-Hora, Rosário, Torrinha, Cedofeita e Breiner e seguia os terrenos entre as ruas do Rosário e Cedofeita, pelo Carregal e Hospital de Santo António e terminava, depois de passar no vale das Virtudes, no rio Douro, por baixo da Alfândega. A ribeira de Massarelos nascia nos terrenos limitados as ruas de Santa Isabel, Boavista, Carvalhosa e Torrinha. A ribeira corria pela rua da Piedade e descia pela rua dos Moinhos até desaguar no Douro na Alameda de Massarelos. O ribeiro ainda está, a céu aberto na descida da rua dos Moinhos. Até quando?
Pela freguesia de Cedofeita passava uma boa parte dos aquedutos de Paranhos e Salgueiros que serviram a cidade do Porto a partir de 1607, embora com uma interrupção entre 1660 e 1669 para reparação do aqueduto. Estes aquedutos alimentavam algumas fontes da freguesia descritas no capítulo 9, nomeadamente: Fonte da Boa Vista, Fonte de Cedofeita, Fonte das Oliveiras, Chafariz do Campo Pequeno, Fonte da Rua do Triunfo. Outras fontes com nascente própria foram referidas em texto anterior, como: Fonte da Lapa ou de Salgueiros (capítulo 8), que pode ter sido apelidado de Chafariz de Santo Ovídio se este não corresponder a uma unidade independente. Mas a abundância de água na freguesia permitiu a existência de fontes suficientes para bem servirem, segundo os valores da época, os habitantes da freguesia.
A Fonte do Paraíso ou Arca dos Tintureiros localizou-se no Lugar do Paraíso, atualmente integrado na rua do Bonjardim, entre a Praça de D. João I e a Rua Formosa (H. Marçal, 1968). Será a fonte da Neta que existiu na Viela dos Tintureiros e que era abastecida com água do manancial de Camões (ver capítulo 8)? Horácio Marçal  dá a entender que eram obras distintas (Marçal, 1968: 9), mas não o prova. Este autor descreve outra fonte, a do Campo da Regeneração, que estava inserta no muro da Quinta dos Pamplonas, a norte do portão principal. Para a banda do sul do Campo da Regeneração (Praça da República) existia um poço de água potável (Marçal, 1968:10).
Uma importante fonte da freguesia foi a de Águas Férreas que se situava no largo das Águas Férreas no extremo da rua das Águas Férreas, atual rua do Melo, perpendicular à Rua da Boavista. A sua nascente foi descoberta em 1784, mas a construção e inauguração da fonte apenas ocorreu, em 1804, a expensas da Câmara Municipal que adquiriu os direitos daquela nascente ao adquirir os terrenos onde ela se encontrava. A fonte tinha duas bicas: a da direita lançava água ferruginosa e a da direita água potável isenta de ferro. Dizia Souza Reys que “as boas águas férreas desta fonte, e tão usadas pelos habitantes da cidade do Porto em várias enfermidades, excitaram o zelo da Câmara Municipal, e aproveitando as mandou fazer uma fonte de pedra e juntou-lhe a construção de uma alameda com assentos para descanso e recreio dos frequentadores destes sítios” (Souza Reys, 1984: 125). Para promover o recurso à água desta fonte, a Câmara Municipal, para além de lá ter colocado um guarda - vigia que controlava o acesso à fonte, arborizou o local e instalou bancos de pedra para doentes e apaixonados, popularizando-se o espaço com o nome de “Alameda da Saúde e do Amor”. As águas das nascentes da fonte das Águas Férreas foram há muitos anos abandonadas por correrem a um nível muito baixo e não permitir quaisquer usos públicos. Foi autorizado o Refúgio da Tutória Central da Infância a captá-las para rega dos terrenos da quinta anexa ao Refúgio e antiga Quinta das Águas Férreas[6]. Foi transferida para o Parque da Cidade em 1995.

Figura 9 - A fonte das Águas Férreas, na sua atual localização no Parque Ocidental da cidade.


Figura 10 - A fonte das Águas Férreas, na sua localização original (J. Bahia. Júnior, 1909: 71)

Segundo Tito de Noronha, a água potável da bica da direita da fonte era boa e agradável.  Atendendo ao grande uso que esta fonte tinha, em 1867, a Câmara mandou, por precaução, o médico António José de Souza caracterizar as águas desta fonte. No seu relatório (Bahia Júnior, 1909: 16), António de Souza concluiu que a água tinha sabor férreo, não tinha cheiro e apresentava em suspensão “corpos entre ocráceos de peróxido de ferro”. Na sua composição química destacava-se a presença “peróxido” de ferro (7 mg/L), cloreto de sódio (56 mg/L), sulfato de magnésio (21 mg/L), sulfato de sódio (11 mg/L), sulfato de cálcio (8 mg/L), carbonato de cálcio (7,5 mg/L), sílica (6,3 mg/L) e matéria orgânica e “albumina” (1,5 mg/L). Concluiu este médico que a água era aplicável “nas moléstias que têm o carácter d’etonia e fraqueza, aplicáveis na “chlorise[7], Escrophulas[8], fluxos mucosos e mus morrhea”. Devemos acrescentar um pormenor muito comum no final de século XIX e em boa parte do século XX: a água seguia da mina até às bicas em cano de chumbo. As análises microbiológicas registadas por J. Bahia Júnior (Bahia Júnior, 1908: 106), a água da bica do lado direito era sofrível, enquanto a da esquerda apresentava o título colibacilar baixo. Todavia, a água medicinal do depósito das águas férreas, apresentava o título ainda mais baixo, isto é, de pior qualidade.
Fonte do Ribeirinho ou dos Ablativos, construída em 1790 e localizada na rua do Ribeirinho, rua Barão de Forrester nos nossos dias, próximo do local onde o metro atravessa esta rua. Encontra-se hoje nos jardins da Quinta do Barão de Nova Sintra para onde foi mudada em 1933 e aí restaurada em 1940. O seu nome deveu-se a “ter numa lápide a inscrição latina composta toda no caso ablativo (Souza Reys, 1984: 191). A água que debitava pela sua única bica vinha de um pequeno ribeiro formado pela água de duas nascente sitas nas faldas do Monte de Germalde (Lapa) e do Monte Cativo.  Da sua bica água caía numa taça. Durante alguns anos a sua água era, aparentemente, de boa qualidade, mas, com o andar dos anos, foi-se degradando.
De Horácio Amaral[9], apresenta-se uma das transcrições da inscrição latina da fonte: “com aprazimento de muitos e desagrado de outros, foram reunidas as águas que corriam sujas e desaproveitadas pelas lajes da rua, e pelas margens do ribeiro, formando charcos imundos, e dificultando a passagem de transeuntes. Assim, as águas conduzidas para esta fonte, tornaram o sítio, até então incómodo e sujo, em belo e cómodo; as águas agora limpíssimas, desalteram os suburbanos sequiosos. Foi esta obra no reinado da piedosa, feliz e augusta Rainha D. Maria I, por diligências de José Ribeiro Vidal da Gama, dos Conselhos de Sua Majestade, Chanceler Portuense, servindo de Presidente do Tribunal de Justiça, no ano de 1790”.
A Fonte dos Ablativos foi transferida, em 1933, para o jardim do Barão de Nova Sintra. Esta fonte é toda em granito, com uma única bica que lançava a água para uma pia semi-circular. Acima da inscrição pode ver-se um medalhão com as armas do Porto usada até 1832.
A água desta fonte foi considerada como boa desde a sua instalação até quase ao final do século XIX. No princípio do séc. XX foi reconhecida como inquinada, mas por pouco tempo porque, entretanto, secou.


Figura 11 - A Fonte dos Ablativos colocada no Jardim do Barão de Nova Sintra.

A Fonte da Carvalhosa recebia a água cristalina de nascente muito próxima, em terreno rochoso, recolhendo-a numa arca onde se inseria uma bica que servia o povo. Como a sua bica estava situada num ponto muito baixo, era bastante incómodo recolher a sua água (Marçal, 1968:10), sendo usada pela gente que vivia perto dela, principalmente a Quinta do Priorado. As suas vertentes seguiam, por volta de 1836, para a Quinta de Francisco Serpa Saraiva (Gomes Leite, 1836: verso da folha 34).
            A Fonte do Monte Cativo estava situada ao fim da rua do Melo. Tinha uma única bica que deitava a água numa pequena pia da qual seguia para os tanques com lavadouros que estavam logo abaixo. A nascente desta fonte encontrava-se a uns 20 metros de distância. As Freiras das Águas Férreas tendo necessidade d'água no seu convento, exploraram uma nascente que está indicada na figura pela letra N, depois do que a água desta fonte diminuiu por lhe ter assim sitio cerceada uma parte com esta exploração, feita a um nível inferior ao da nascente da fonte. Sob o ponto de vista microbiológico, a água da Fonte do Monte Cativo era, em 1900, provavelmente pura, mas em 1907 já era considerada como má (J. Bahia Júnior, 1909: 26).


Figura 12 - A Fonte do Monte Cativo na primeira década do século XX (J. Bahia Júnior, 1909: 71).




[1] Razão entre o número de habitantes com idade igual ou superior a 65 anos e o número de habitantes com idades compreendidas entre 0 e 14 anos, expresso como N/100.
[2] Este convento, fundado em 1491, situava-se junto ao muro da cidade (Muralha Fernandina), no atual Quarteirão das Cardosas,
[3] Seabra, A. L. S. R, 2012, Os Lóios do Porto – de Convento a Palácio, Dissertação de Mestrado, Departamento de Ciências da Vida da Universidade de Coimbra.
[4] Reproduzido de Portal das Freguesias – Cedofeita, consultado, em 2/2/19, em ttps://goo.gl/rvssB7.
[5] Santos Castro, C., P., 2012, A Reforma Administrativa das Freguesias no Contexto de Mudança da Administração Pública – O caso do município do Porto, Dissertação de Mestrado em Direito das Autarquias Locais apresentada na Escola de Direito da Universidade do Minho: 95.
[6] António Maria Trigo, O Tripeiro, Ano V, n.º 4, agosto de 1949: 96.
[7] Clorose - doença feminil caracterizada por uma palidez esverdinhada e excessiva fraqueza (Dicionário Priberam).
[8] Escrófula – aumento do volume dos gânglios linfáticos cervicais, provocado pela tuberculose (Dicionário Priberam).
[9] Marçal, H., 1966, O Tripeiro, VI série, ano VI.