ANTIGA FREGUESIA DE SANTO ILDEFONSO
Com o aumento da
população dentro dos muros, a cidade do Porto estendeu-se para fora do recinto
da muralha, resultando daí, em meados do século XVIII, mais duas paróquias:
Miragaia e Santo Ildefonso. Embora o arrabalde de Santo Ildefonso, extramuros,
fosse muito mais antigo, a freguesia com esse nome foi criada em 24 de junho de
1634, à data com 1790 almas, que tinha como limites: a poente, Miragaia e Couto
de Cedofeita; a norte, o Campo de Santo Ovídio e o Couto de Paranhos; a
nascente, era limitada por Campanhã; a sul, o limite ia da Porta da Batalha até
ao Calvário Novo; daquela Porta caminhava para poente ladeando a muralha
Fernandina até ao assento das Virtudes. Dada a desigual distribuição de áreas e
de população, esta freguesia, de enorme território, foi desmembrada, em 1841,
por um decreto de Costa Cabral que fundava a nova freguesia de Bonfim.
Com data de 8 de
Fevereiro de 1956, foi publicado um Decreto assinado por Francisco Higino
Craveiro Lopes (Presidente da República), António de Oliveira Salazar
(Presidente do Conselho de Ministros) e por Joaquim Trigo de Negreiros
(Ministro do Interior) e com o número 40 526 que estabelecia a nova delimitação
das freguesias do concelho do Porto. No que a Santo Ildefonso diz respeito, o
texto da sua delimitação era o seguinte: com início na Avenida de Rodrigues de
Freitas, no cruzamento com a Rua de S. Vitor (vértice comum às três freguesias:
Santo Ildefonso, Bonfim e Sé), segue pela Rua de D. João IV até à Rua da
Firmeza, Rua da Firmeza, para poente, até à Rua da Alegria, Rua da Alegria,
para norte, até à Rua da Escola Normal. Rua da Escola Normal, Rua de Santa
Catarina para norte, arruamento nascente da Praça do Marquês de Pombal. Rua da
Constituição, para poente, até à Rua de S. Brás e por esta rua, para sul, até à
Rua do Paraíso, Rua da Regeneração, arruamento nascente da Praça da República.
Rua do Almada até à Rua de Ricardo Jorge, onde fica o vértice comum às três
freguesias: Cedofeita, Santo Ildefonso e Vitória. Rua do Almada, para sul, até
à Rua dos Clérigos, onde fica o vértice comum às três freguesias: Vitória,
Santo Ildefonso e Sé, seguindo, para nascente, pelo arruamento sul da Praça da
Liberdade. Praça de Almeida Garrett, Rua da Madeira até à Praça da Batalha e
deste ponto até à parede divisória dos prédios n.os 19 e 20 da Praça da Batalha
e daqui, contornando a propriedade do Teatro Águia de Ouro, até junto ao cunha
sudoeste do prédio n.º 1 da Rua de Entreparedes. Rua de Entreparedes, para
nordeste, e Avenida de Rodrigues de Freitas até à Rua de S. Vitor.
Em 2012, deu-se a reorganização
administrativa do território (Lei n.º 22/2012, de 30 de maio) levando a
freguesia de Santo Ildefonso a juntar-se
às de Cedofeita, Sé, Miragaia, São Nicolau e Vitória para formar uma União.
Santo Ildefonso,
freguesia essencialmente urbana, foi enriquecida, a partir do século XVIII, com
alguns lugares emblemáticos do Porto: As praças da Batalha e dos Poveiros, e as
conhecidas ruas de Santa Catarina, 31 de Janeiro, Passos Manuel, Sá da Bandeira,
etc, e alguns locais de visita obrigatória para os turistas como o são o
Mercado do Bolhão, atualmente em remodelação, “A Brasileira”, antigo café que
sofreu enorme benefício e agora é restaurante e hotel, o café Magestic,
inaugurado em 1921, a Capela das Almas cujos azulejos das paredes exteriores
são dos mais fotografados do país, a Igreja da Trindade, os Paços do Concelho
e, claro, a avenida dos Aliados, sala de visitas do Porto, que se estende aos
pés daqueles Paços.
Em 1623, D Rodrigo da
Cunha fez a primeira contagem conhecida da população de Santo Ildefonso,
adiantando os seguintes números: 1150 habitantes, dos quais 150 eram menores.
Nos séculos XVII e XVIII o crescimento da população desta freguesia foi
notável. Por exemplo, a população aumentou de 22.714, em 1732, para 46.404
habitantes, em 1789. Não admira, por isso, que, em 1841, tenha sido criada a
freguesia de Bonfim com uma boa parte do território de Santo Ildefonso,
passando, este, a ocupar a área de 1,2 km2, onde habitavam, em 2011,
apenas 9.029 pessoas (decréscimo de 37,7% na população entre 1991 e 2011), com
o índice de envelhecimento[1] de 309, muito superior ao do concelho de Porto,
195, e ao do país, 129.
A freguesia de Santo
Ildefonso ocupa dois naturais vales secundários responsáveis pela existência de
importantes reservas de água. Um, o de Fradelos, com início na rua da Fontinha,
situa-se entre os montes dos Congregados e da Fontinha; o segundo, a que muitos
chamaram de Germalde, orienta-se por entre as ruas de Bonjardim, Camões, passa pela
Trindade e junta-se ao primeiro na atual Praça da Liberdade; este vale recebe a
vertente oriental do monte da Lapa e a ocidental do monte da Fontinha. As duas
linhas de água definidas nos dois vales levam a água até à sua confluência,
formando o mais importantes rio que percorria o Porto antigo – o Canal Maior ou
rio da Vila. A expansão e o desenvolvimento urbanístico da cidade do Porto
escondeu, em parte, esta realidade ocultando a água e planificando o relevo. A
impermeabilização do solo, em grande parte ilegal, apressou a viagem da água
pluvial para o Douro, empobrecendo os mananciais ou fazendo com que eles
tenham, pura e simplesmente, desaparecido. A construção de caves e garagens em
profundidade agravou a situação, fazendo desaparecer minas e poços. Esta
prática continua desgraçadamente a acontecer.
Os mananciais do
Largo da Aguardente (Marquês de Pombal) e Camões e nascentes próprias
alimentaram um bom número de fontes que serviam a população da freguesia e quem
nela passava. Algumas recebiam a água de mananciais das freguesias vizinhas,
destacando-se o de Mijavelhas. No capítulo 4 descreve-se a Fonte da Porta dos
Carros que recebia a água de uma nascente sita na Calçada da Teresa. No
capítulo sexto descrevem-se as fontes e chafarizes da Batalha, do Terreiro da
Batalha, da rua de Santo Ildefonso (Padrão das Almas), do Convento de Santo
António da Cidade, do Jardim de S. Lázaro, da Viela das Pombas ou Primeira
Fonte da Rua de Santa Catarina, do Canavarro ou a Segunda Fonte da Rua de Santa
Catarina, a Fonte Seca ou Terceira Fonte da Rua de Santa Catarina, a da
Natividade e a do Bolhão. O Chafariz de Camões ou da Feira dos Carneiros, a
Fonte da Praça da Trindade, a Fonte do Hospital da Trindade, a Fonte da Rua do
Laranjal, o Chafariz da Praça de D. Pedro, a fonte de Vila Parda foram
descritas no capítulo 8. As fontes da rua de Sá da Bandeira, a dos Paços do Concelho
e a Fonte do Olho do Cu (capítulo 8), eram abastecidas com água do manancial de
Camões. A Fonte da Rua da Alegria, descrita no capítulo 14, recebia a água do
manancial do Largo da Aguardente.
Na freguesia
existiram, ou existem, mais fontes do que as que já foram descritas. Na praça
de Gomes Teixeira existiu um chafariz com o nome do Colégio dos Meninos
Órfãos que ficava no terreiro da Graça à beira da Igreja de Nossa Senhora
da Graça que desapareceu, entre 1900 e 1905, para dar lugar à Praça Parada
Leitão. Por sua vez, a fonte também foi substituída pela Fonte dos Leões. O Chafariz
do Terreiro do Convento dos Lóios ou de Santa Maria da Consolação esteve
instalado no largo dos Lóios[2].
No centro do Claustro deste Convento foi encontrada uma fonte ou chafariz que
era alimentada por um tubo que atravessava uma das sepulturas aí existentes
(Seabra, 2012: 21[3]).
Deste chafariz a água era distribuída por diversas dependências do convento.
Acrescente-se que no Largo dos Lóios existiu um pequeno lago circular de mau
gosto, tanto assim que lhe atribuíram o nome de Alguidar dos Lóios, utilizado,
segundo as más línguas, para “demolhar o bacalhau das sextas-feiras” (O
Tripeiro, n.º 7, abril de 1926).
A construção da Fonte da rua da Fontinha ter-se-á iniciado
em 1861 e terminado em 1866, em frente à travessa da Fontinha, para substituir
a Fonte Seca sita na Rua da Bela Princesa, hoje a parte norte da Rua de Santa
Catarina, que entretanto tinha ficado sem água. Era alimentada, por meio de uma
canalização de chumbo, com a água da nascente localizada no largo da Fontinha.
Em 1866, foi transferida para a rua das Carvalheiras de Cima e mais tarde,
1942, para o jardim do Porque de Nova Sintra. Esta fonte era simplesmente
constituída por um pilar granítico, com uma bica que lançava a água para um
pequeno tanque (figuras 2 e 3). A água desta fonte era de má qualidade. Não
muito longe desta fonte encontrava-se a
Fonte das Musas que foi construída em 1859 e esteve localizada defronte
do chafariz de Vila Parda, na rua do Bonjardim. Rebelo da Costa, 1789,
considerava que esta fonte servia água que, em bondade, seguia à de Paranhos
que era “pura, claríssima, muito leve e
desobstruente”. O padre Duarte Simão de Oliveira, citado por Teixeira, 2011,
classificava-a como “tosca de boas águas, mas não muitas, no sítio de Santa
Catarina”. Opinião contrária refletem os péssimos resultados das análises
microbiológicas registadas por Bahia Júnior.
Figura
2 –
A Fonte da rua da Fontinha, agora instalada no Parque de Nova Sinta
A Fonte de Fradelos, construída em 1702, situou-se na parte alta da
atual Rua Sá da Bandeira, na encosta sul do Monte de Fradelos, na travessa que
ia da rua de Santa Catarina para a rua do Bonjardim. Essa travessa situava-se
atrás do antigo quartel dos Bombeiros Municipais à rua de Gonçalo Cristóvão.
Era uma fonte com pouca água, funda, e com lavadouros. As vertentes das fonte
seguiam para a quinta dos Maias. A fonte ostentava no frontispício um nicho com
a imagem de Nossa Senhora da Boa Hora (Marçal, 1968). De acordo com Bahia
Júnior, era a mais imunda fonte de Santo Ildefonso, com o recinto coberto de
bolos fecais. Tinha no seu frontispício a imagem de Nossa Senhora da Boa Hora.
Velasques refere a existência de algumas pedras desta fonte junto da Igreja de
Fradelos. Nascendo naquele monte, corria por ali um pequeno ribeiro, o de
Fradelos, que desaguava, em frente da Igreja dos Congregados, no rio da Vila. A
água desta fonte era, segundo J. Bahia Júnior, de má qualidade bacteriológica.
A norte do lugar de Fradelos erguia-se o monte de S. João do Bonjardim que foi
parcialmente desbastado para aí se construir a rua de Gonçalo Cristóvão.
Figura
4
- A Fonte de Fradelos onde se destaca a imundície (Fonte: J. Bahia Júnior, 1908:59)
O Chafariz ou Fonte Luminosa foi oferecida pela seguradora “A
Confidente” e foi instalada, em 1966, na placa central da Praça de D. João I. A fonte estava colocada no centro
da rosa dos ventos desenhada no pavimento que indicava a direção norte –sul e
era rodeada pelos símbolos do zodíaco. Quando da “reabilitação” daquela praça,
a fonte foi dali removida e instalada, em 2006, na Praça do Marques de Pombal.
A fonte tem um tanque circular com repuxo no centro cuja água, impulsionada por
meio de uma eletrobomba, forma uma copa de água com forma cónica. Na mesma
praça encontra-se também um espelho de água de estrutura retangular com um lado
na forma de semi-círculo que se opõe ao espaldar onde se assenta um golfinho
que lança, pela boca, a água que é reciclada do tanque por meio de eletrobomba.
Figura 5 –
A Fonte que foi luminosa, agora instalada no jardim da Praça do Marques de
Pombal
Figura 6 –
Aspeto de uma das fases da construção da Fonte luminosa (Fonte: Arquivo
Municipal do Porto, https://goo.gl/pPJYYj)
Figura 7 –
O espelho de água do Jardim da Praça do Marques de Pombal. As pombas parecem
esperar que a água chegue ao tanque.
ANTIGA
FREGUESIA DE CEDOFEITA
A freguesia de Cedofeita terá nascido à volta
da igreja românica de Cedofeita que pertenceu a um convento dos Cónegos
Regrantes de Santo Agostinho, sita no Largo do Priorado, provavelmente a mais
antiga da cidade do Porto. Uma inscrição existente na frontaria da igreja dá o
ano de 559 como o da fundação da igreja. Nessa data, a região compreendida
entre Lisboa e o rio Minho era ocupada pelos suevos, associados aos visigodos,
vândalos e alanos. A sua construção deveu-se ao rei suevo Teodomiro que se
tinha convertido ao catolicismo. Como o edifício original se foi arruinando,
sofre uma primeira restauração no século XII. A atual configuração da igreja
resulta das alterações que lhe foram introduzidas em 1742. É interessante
reconhecer que nesta igreja sempre a pratica cristão foi exercida, mesmo quando
da ocupação mourisca mercê o consentimento dado através de uma “Carta de Jusgo”
do seguinte teor: “Abdelassis Abhrem
Mahomet, por illah illalah senhor da cidade do Porto, e da gente da Nazareth,
pela qual ordeno que os Presbíteros e Cristãos do Mosteiro de Cedofeita que moram
junto à dita cidade do Porto, e seu mosteiro possuam os seus bens em paz e quietação
sem opressão, vexame ou força dos Sarracenos; com a condição que não digam
Missas senão com as portas fechadas e não toquem as suas campainhas; e paguem
pelo consentimento 50 pesantes de boa prata anualmente e possam sair e vir à
cidade com liberdade e quando quiserem, e não vão fora das terras do meu mando
sem meu consentimento e vontade; assim o mando; e faço esta carta de salvo
conduto, e a dou ao dito Mosteiro para que a possua para seu sossego...»[4]. A
última restauração da igreja concretizou-se em 1934.
O termo Cedofeita, especialmente o seu
mosteiro, é citado na Bula do Papa Calisto II, de 1120, e a Carta de Doação de
D. Afonso II, de 1218[5]. A
integração do Couto de Cedofeita na urbe do Porto ter-se-á dado na transição do
século XVI para o XVII, mas a integração formal deu-se, em 1710, por decisão da
Mesa Grande da Relação a urbe foi estendida, para fora da muralha, para as freguesias
de Vitória, Miragaia, Santo Ildefonso, Massarelos e Cedofeita.
Geograficamente, Cedofeita tem como limites os
seguintes arruamentos: Rua de Miguel Bombarda, Rua de Diogo Brandão, Rua de
Cedofeita (parte), Rua da Conceição, Rua do Dr. Ricardo Jorge, Rua do Almada,
parte da Rua de Gonçalo Cristóvão, face leste e norte da Praça da República,
Rua da Regeneração, Rua de São Brás, Rua da Constituição (parte), Rua de Cunha
Júnior, Trav. do Monte Louro, Rua do Almirante Leote do Rego, Trav. e Rua de
Ribeiro de Sousa, Rua do Padre Pacheco do Monte, Rua do Monte Alegre, Rua do
Zambeze, Rua do Zaire, parte da Rua de Serpa Pinto, Rua de S. Dinis, Rua da
Natária, Rua da Prelada e Rua de Pedro Hispano (até ao viaduto), Rua de 5 de
outubro, Rua de Fernandes Costas, Praça de Mouzinho de Albuquerque, Rua de
Júlio Dinis, Rua do Padre Cruz, Largo de Alexandre Sá Pinto, Rua da Torrinha,
Rua da Boa Hora, Rua do Rosário, Largo da Maternidade e parte da Rua de Adolfo
Casais Monteiro que chega até à Rua de Miguel Bombarda.
Figura
8 - Mapa da freguesia de Cedofeita. Descarregado de https://goo.gl/HU3oR3,
em 3 de março de 2019.
Atualmente a atividade económica envolve,
essencialmente, o comércio o turismo e a restauração. Nos últimos cinquenta
anos a freguesia perdeu importantes estabelecimentos de ensino superior público,
restando no território da freguesia apenas as Faculdades de Direito e de
Farmácia. Em termos de equipamento, encontramos o Hospital Militar, o Hospital
de Maria Pia e o Quartel General. População em 2011 – 22.022 habitantes. O
índice de envelhecimento da freguesia, em 2011, era de 283, superior ao do
concelho do Porto, 195.
A freguesia de Cedofeita desenvolve-se por um
planalto que recebe as águas que descem pelo subsolo e superfície de encostas
dos montes Pedral, Ramada Alta e S. Brás, reunidas em dois talvegues que
definiram dois ribeiros já descritos nos capítulos 3 e 7, o denominado rio Frio
e a ribeira de Massarelos. O primeiro nascia na área limitada pelas ruas da
Boa-Hora, Rosário, Torrinha, Cedofeita e Breiner e seguia os terrenos entre as
ruas do Rosário e Cedofeita, pelo Carregal e Hospital de Santo António e
terminava, depois de passar no vale das Virtudes, no rio Douro, por baixo da
Alfândega. A ribeira de Massarelos nascia nos terrenos limitados as ruas de
Santa Isabel, Boavista, Carvalhosa e Torrinha. A ribeira corria pela rua da
Piedade e descia pela rua dos Moinhos até desaguar no Douro na Alameda de
Massarelos. O ribeiro ainda está, a céu aberto na descida da rua dos Moinhos.
Até quando?
Pela freguesia de
Cedofeita passava uma boa parte dos aquedutos de Paranhos e Salgueiros que
serviram a cidade do Porto a partir de 1607, embora com uma interrupção entre
1660 e 1669 para reparação do aqueduto. Estes aquedutos alimentavam algumas
fontes da freguesia descritas no capítulo 9, nomeadamente: Fonte da Boa Vista, Fonte
de Cedofeita, Fonte das Oliveiras, Chafariz do Campo Pequeno, Fonte da Rua do
Triunfo. Outras fontes com nascente própria foram referidas em texto anterior,
como: Fonte da Lapa ou de Salgueiros (capítulo 8), que pode ter sido apelidado
de Chafariz de Santo Ovídio se este não corresponder a uma unidade
independente. Mas a abundância de água na freguesia permitiu a existência de
fontes suficientes para bem servirem, segundo os valores da época, os
habitantes da freguesia.
A Fonte do Paraíso
ou Arca dos Tintureiros localizou-se no Lugar do Paraíso, atualmente
integrado na rua do Bonjardim, entre a Praça de D. João I e a Rua Formosa (H.
Marçal, 1968). Será a fonte da Neta que existiu na Viela dos Tintureiros e que
era abastecida com água do manancial de Camões (ver capítulo 8)? Horácio
Marçal dá a entender que eram obras
distintas (Marçal, 1968: 9), mas não o prova. Este autor descreve outra fonte, a
do Campo da Regeneração, que estava
inserta no muro da Quinta dos Pamplonas, a norte do portão principal. Para a
banda do sul do Campo da Regeneração (Praça da República) existia um poço de
água potável (Marçal, 1968:10).
Uma importante fonte da
freguesia foi a de Águas Férreas que
se situava no largo das Águas Férreas no extremo da rua das Águas Férreas,
atual rua do Melo, perpendicular à Rua da Boavista. A sua nascente foi descoberta
em 1784, mas a construção e inauguração da fonte apenas ocorreu, em 1804, a
expensas da Câmara Municipal que adquiriu os direitos daquela nascente ao
adquirir os terrenos onde ela se encontrava. A fonte tinha duas bicas: a da
direita lançava água ferruginosa e a da direita água potável isenta de ferro. Dizia
Souza Reys que “as boas águas férreas
desta fonte, e tão usadas pelos habitantes da cidade do Porto em várias
enfermidades, excitaram o zelo da Câmara Municipal, e aproveitando as mandou
fazer uma fonte de pedra e juntou-lhe a construção de uma alameda com assentos
para descanso e recreio dos frequentadores destes sítios” (Souza Reys,
1984: 125). Para promover o recurso à água desta fonte, a Câmara Municipal,
para além de lá ter colocado um guarda - vigia que controlava o acesso à fonte,
arborizou o local e instalou bancos de pedra para doentes e apaixonados,
popularizando-se o espaço com o nome de “Alameda da Saúde e do Amor”. As águas
das nascentes da fonte das Águas Férreas foram há muitos anos abandonadas por
correrem a um nível muito baixo e não permitir quaisquer usos públicos. Foi
autorizado o Refúgio da Tutória Central da Infância a captá-las para rega dos
terrenos da quinta anexa ao Refúgio e antiga Quinta das Águas Férreas[6]. Foi
transferida para o Parque da Cidade em 1995.
Figura
9
- A fonte das Águas Férreas, na sua atual localização no Parque Ocidental da
cidade.
Figura
10
- A fonte das Águas Férreas, na sua localização original (J. Bahia. Júnior,
1909: 71)
Segundo Tito de
Noronha, a água potável da bica da direita da fonte era boa e agradável. Atendendo ao grande uso que esta fonte tinha,
em 1867, a Câmara mandou, por precaução, o médico António José de Souza
caracterizar as águas desta fonte. No seu relatório (Bahia Júnior, 1909: 16), António
de Souza concluiu que a água tinha sabor férreo, não tinha cheiro e apresentava
em suspensão “corpos entre ocráceos de
peróxido de ferro”. Na sua composição química destacava-se a presença
“peróxido” de ferro (7 mg/L), cloreto de sódio (56 mg/L), sulfato de magnésio
(21 mg/L), sulfato de sódio (11 mg/L), sulfato de cálcio (8 mg/L), carbonato de
cálcio (7,5 mg/L), sílica (6,3 mg/L) e matéria orgânica e “albumina” (1,5
mg/L). Concluiu este médico que a água era aplicável “nas moléstias que têm o
carácter d’etonia e fraqueza, aplicáveis na “chlorise[7],
Escrophulas[8],
fluxos mucosos e mus morrhea”. Devemos acrescentar um pormenor muito comum
no final de século XIX e em boa parte do século XX: a água seguia da mina até
às bicas em cano de chumbo. As análises microbiológicas registadas por J. Bahia
Júnior (Bahia Júnior, 1908: 106), a água da bica do lado direito era sofrível,
enquanto a da esquerda apresentava o título colibacilar baixo. Todavia, a água
medicinal do depósito das águas férreas, apresentava o título ainda mais baixo,
isto é, de pior qualidade.
Fonte
do Ribeirinho ou dos Ablativos, construída em 1790 e
localizada na rua do Ribeirinho, rua Barão de Forrester nos nossos dias, próximo
do local onde o metro atravessa esta rua. Encontra-se hoje nos jardins da
Quinta do Barão de Nova Sintra para onde foi mudada em 1933 e aí restaurada em
1940. O seu nome deveu-se a “ter numa lápide a inscrição latina composta toda
no caso ablativo (Souza Reys, 1984: 191). A água que debitava pela sua única
bica vinha de um pequeno ribeiro formado pela água de duas nascente sitas nas
faldas do Monte de Germalde (Lapa) e do Monte Cativo. Da sua bica água caía numa taça. Durante
alguns anos a sua água era, aparentemente, de boa qualidade, mas, com o andar
dos anos, foi-se degradando.
De Horácio Amaral[9],
apresenta-se uma das transcrições da inscrição latina da fonte: “com aprazimento de muitos e desagrado de
outros, foram reunidas as águas que corriam sujas e desaproveitadas pelas lajes
da rua, e pelas margens do ribeiro, formando charcos imundos, e dificultando a
passagem de transeuntes. Assim, as águas conduzidas para esta fonte, tornaram o
sítio, até então incómodo e sujo, em belo e cómodo; as águas agora limpíssimas,
desalteram os suburbanos sequiosos. Foi esta obra no reinado da piedosa, feliz
e augusta Rainha D. Maria I, por diligências de José Ribeiro Vidal da Gama, dos
Conselhos de Sua Majestade, Chanceler Portuense, servindo de Presidente do
Tribunal de Justiça, no ano de 1790”.
A Fonte dos Ablativos foi transferida, em 1933,
para o jardim do Barão de Nova Sintra. Esta fonte é toda em granito, com uma
única bica que lançava a água para uma pia semi-circular. Acima da inscrição
pode ver-se um medalhão com as armas do Porto usada até 1832.
A água desta fonte foi considerada como boa
desde a sua instalação até quase ao final do século XIX. No princípio do séc.
XX foi reconhecida como inquinada, mas por pouco tempo porque, entretanto,
secou.
Figura 11 - A
Fonte dos Ablativos colocada no Jardim do Barão de Nova Sintra.
A Fonte da Carvalhosa recebia a água cristalina de nascente muito
próxima, em terreno rochoso, recolhendo-a numa arca onde se inseria uma bica
que servia o povo. Como a sua bica estava situada num ponto muito baixo, era
bastante incómodo recolher a sua água (Marçal, 1968:10), sendo usada pela gente
que vivia perto dela, principalmente a Quinta do Priorado. As suas vertentes
seguiam, por volta de 1836, para a Quinta de Francisco Serpa Saraiva (Gomes
Leite, 1836: verso da folha 34).
A Fonte do Monte Cativo estava situada ao fim da rua do Melo. Tinha
uma única bica que deitava a água numa pequena pia da qual seguia para os
tanques com lavadouros que estavam logo abaixo. A nascente desta fonte encontrava-se
a uns 20 metros de distância. As Freiras das Águas Férreas tendo necessidade
d'água no seu convento, exploraram uma nascente que está indicada na figura
pela letra N, depois do que a água desta fonte diminuiu por lhe ter
assim sitio cerceada uma parte com esta exploração, feita a um nível inferior
ao da nascente da fonte. Sob o ponto de vista microbiológico, a água da Fonte
do Monte Cativo era, em 1900, provavelmente pura, mas em 1907 já era
considerada como má (J. Bahia Júnior, 1909: 26).
Figura 12 - A
Fonte do Monte Cativo na primeira década do século XX (J. Bahia Júnior, 1909:
71).
[1] Razão entre o número de habitantes com
idade igual ou superior a 65 anos e o número de habitantes com idades
compreendidas entre 0 e 14 anos, expresso como N/100.
[2] Este convento, fundado em 1491,
situava-se junto ao muro da cidade (Muralha Fernandina), no atual Quarteirão
das Cardosas,
[3] Seabra, A. L. S. R, 2012, Os Lóios do
Porto – de Convento a Palácio, Dissertação de Mestrado, Departamento de
Ciências da Vida da Universidade de Coimbra.
[4] Reproduzido de Portal das Freguesias –
Cedofeita, consultado, em 2/2/19, em ttps://goo.gl/rvssB7.
[5] Santos Castro, C., P., 2012, A Reforma
Administrativa das Freguesias no Contexto de Mudança da Administração Pública –
O caso do município do Porto, Dissertação de Mestrado em Direito das Autarquias
Locais apresentada na Escola de Direito da Universidade do Minho: 95.
[6] António Maria Trigo, O Tripeiro, Ano
V, n.º 4, agosto de 1949: 96.
[7] Clorose - doença feminil caracterizada
por uma palidez esverdinhada e excessiva fraqueza (Dicionário Priberam).
[8] Escrófula – aumento do volume dos
gânglios linfáticos cervicais, provocado pela tuberculose (Dicionário
Priberam).
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