Bonfim
e a água
Em fevereiro
de 1831, por divisão das freguesias da Sé, Santo Ildefonso e Campanhã, foi
autorizada a criação da freguesia do Bonfim, sancionada mais tarde, em dezembro
de 1841, por decreto de Costa Cabral. Esta freguesia desenvolveu-se à volta do
Monte das Feiticeiras, onde se construiu o cruzeiro do Senhor do Bom Fim e da
Boa Morte e que é, atualmente, ocupado pela Igreja de Bonfim. A freguesia
incluía a área que envolvia a urbe do Porto e por onde passavam os caminhos que
dela se dirigiam para Gondomar, para Valongo e daí para Trás-os-Montes,
passando por Penafiel e Amarante.
A freguesia
do Bonfim foi o lugar eleito para a instalação de um grande número de fábricas
que a transformaram, a partir de meados do séc. XIX, como o principal pólo
industrial do Porto, na qual predominava a indústria têxtil. Com a chegada do
comboio à estação de Campanhã, a cidade passou a receber uma mole humana que
procurava fugir à pobreza dos campos e era atraída pela perspectiva de uma nova
e melhor vida. Tantos foram que os salários baixaram, o desemprego subiu e a
habitação escasseou. A miséria instalou-se no Porto e arredores num período que
devia ter sido de melhoria da qualidade de vida. Expandiram-se então as ilhas,
forma precária de habitação. Pequenas casas com reduzido pé-direito, com o
mínimo de divisões, com luz e ventilação escassas, sem água potável e com
retrete comum, por vezes com poço não muito longe da latrina. Melhor definição
de “ilha” como a de Ricardo Jorge não conhecemos, que cruelmente dizia: “São renques de cubículos, às vezes
sobrepostos em andar, enfiados em coxia de travesso. Este âmbito, onde se apilham
camadas de gente, é por via de regra um antro de imundície; e as casinhas em
certas ilhas, dessoalhadas e miseráveis, pouco acima estão da toca lôbrega dum
troglodita” (Jorge citado em Pinto 2012: 13)[1].
Esta miserável forma de viver fez com que a freguesia apresente, no final do
século XIX, valores da mortalidade superiores a 30‰ (Pinto, 2012: 6).
Para além da
classe operária, também se dirigiram para a área de Bonfim industriais e
comerciantes, alguns deles brasileiros de torna-viagem, que construíram alguns
palacetes e deram origem ao rasgar de novas ruas e avenidas no lugar onde
existiram importantes quintas como a de Cirnes, antes do Reimão. O palácio desta
quinta foi comprado pela Junta de Freguesia em 1880, que ainda o ocupa. Muitos
desses «brasileiros» investiram largas somas de dinheiro na freguesia, não só
nas suas habitações, mas também nas fábricas de tecelagem e cerâmica e em
melhoramentos infra-estruturais. Há alguns anos que as fábricas da freguesia
fecharam as suas portas, dando lugar a outras atividades económicas, tais como
o comércio e a restauração, o ensino e a saúde, as instituições bancárias, as
pequenas empresas, os serviços e o turismo. Esta pujante atividade dos nossos
dias tem funcionado como impulsionador da recuperação de uma boa
parte dos edifícios da freguesia do Bonfim, enriquecendo a cidade do Porto.
A freguesia
de Bonfim ocupa uma área de 3 km2. O crescimento populacional da
freguesia do Bonfim na segunda metade do século XIX foi explosivo, tornando-se,
em 1890, como a freguesia mais populosa do Porto com 22 512 habitantes, posição
que manteve até 1930. No último recenseamento, o de 2011, a população residente
na freguesia do Porto era de 24 265, dos quais 10 674 homens e 13 591 mulheres,
ocupando o quarto lugar atrás de Paranhos, Ramalde e Campanhã.
Figura
1 – limites da freguesia. Fonte: http://www.jfbonfim.pt/Mapas-da-Freguesia,
descarregado em 12/11/2018
O Vale de
Bonfim, descrito na Parte 5, sempre foi rico em água que se acumulava em
mananciais que alimentavam uma boa parte das fontes das freguesias da Sé, Santo
Ildefonso, Bonfim e Campanhã. Para além do Manancial de Mijavelhas que terá
desaparecido e substituído no uso da água pelo do Campo Grande, foram
identificados o de Montebelo e algumas minas que abasteciam a Arca do Campo
Grande que partilhava a água com a freguesia de Santo Ildefonso, os mananciais
do Bispo ou Mitra, o das Freiras, o da Cavaca, o da Aguardente ou Marquês de
Pombal, e o manancial das Fontainhas, o primeiro a alimentar a antiga urbe.
Muitas das fontes desta freguesia foram referidas em capítulos anteriores: Fontainhas (Parte
2), Canavarro ou Segunda Fonte de
Santa Catarina, Marquês de Pombal, Exterior e Interior do Prado Repouso (Parte
5) e Firmeza (agora na
Praça das Flores da freguesia de Campanhã), S. Jerónimo
ou Largo da Póvoa, Padrão de Campanhã, Padrão ou Santo Ildefonso e Fonte Seca
ou Terceira Fonte de Santa Catarina (Parte 6).
Figura 2 - Planta do Aqueduto de Mijavelhas entre a Capela de Santo André e a Rua
do Senhor do Bonfim, desenhada por Theodoro de Souza Maldonado e aprovada pela
Junta de Obras Públicas em 1795-06-11. Legenda: A – Capela de S. André; B – Rua
Direita de Santo Ildefonso; C – Campo de S. Lázaro; D - Rua de Reimão; E –
Ponte das Patas; F – Arca d’Água, donde parte o aqueduto com o n.º 4 que
atravessa a ponte no ponto y, e entra na cerca dos Antoninhos (Convento
de Santo António) no ponto a, e vai ao Campo de S. Lázaro atravessando o
convento no ponto b, onde tem um braço para o Colégio das Órfãs, e continua até
C onde tem outro para a fonte Z. Pode melhorar-se o aqueduto fazendo-o
descrever a linha n.º 2 atravessando o ribeiro no ponto K mais estreito e com
as precauções necessárias, tornando a seguir a linha do velho no ponto h
até S, e daí continuar pela travessa e campo até c, deixando um braço
para o Colégio das Órfãs no ponto L; G – Rua do Senhor do Bonfim. Descarregado
em 12/4/18 de https://goo.gl/LJDhuu.
Das fontes e
chafarizes ainda não identificados é justo fazer uma referência especial ao Chafariz de
Mijavelhas, mais tarde Fonte do Campo Grande (Velasques, 1991:
194). Esta fonte, de mergulho ou chafurdo, terá sido construída antes de 1384 e
alteada, poucos anos antes de 1548, com a construção de uma arca e pavimentação
da área envolvente. Foi desta arca que, em 1633, a sua água foi levada até à
Fonte da Rua Chã. Em 1819, a arca foi transformada em reservatório arcado,
sendo este o que foi reconstruído na estação de metropolitano do Campo 24 de
Agosto. Mais modesta era a desaparecida Fonte do Caes,
que esteve no muro da Quinta da China, junto ao rio Douro à beira da Estrada
Marginal, atual Avenida Paiva Couceiro. Brotava de mina própria, saindo por um
pequeno pedestal de pedra e caindo numa pia de modo a que os animais a usassem
(Velasques, 1991: 193 -194).
A Fonte da
Rua da Alegria, que esteve instalada na Rua que lhe deu o nome, recebia a
água do Manancial da Praça do Marques de Pombal que a despejava num tanque
existente nas suas traseiras com capacidade para servir de apoio aos incêndios
em caso de necessidade. Era este tanque que alimentava uma única bica da fonte
e a lançava para um tanque maior e central e deste para dois tanques laterais. A fonte pertenceu aos Padres
Congregados do Oratório de S. Filipe (Santo Ildefonso).
Figura 3 - A Fonte da Rua da Alegria (Bahia
Júnior, 1909: 42)
Figura 4 - O tanque que se encontrava nas
traseiras da Fonte da Rua da Alegria. Este tipo de tanques eram
importantíssimos para o combate aos frequentes incêndios que ocorriam no centro
da cidade. JBJ pág. 42
A Fonte do
Seixal localizava-se na Travessa do Seixal, hoje Rua Aurélio de Sousa. Na
realidade era um poço protegido com uma bomba de acionamento manual. A água da
bica era recebida por um recipiente ou, então, seguia para o tanque lavadouro.
Quando havia água com abundância, o nível do poço subia e acabava por sair pela
bica, tornando desnecessária a bomba. Embora protegido por uma porta de acesso,
a água do poço sofria da contaminação da libertação urinária e descarga fecal,
muito frequente junto à fonte. Como resultado das evidentes contaminações, a
qualidade bacteriológica água era considerada como má (Bahia Júnior, 1909: 49;
26).
Figura 5 - Fonte do Seixal (Bahia Júnior, 1909: 49)
Desconhecida
da grande maioria dos tripeiros, apesar de se encontrar numa das ruas mais
movimentadas do Porto, a Fonte da Rua da Prata está inserida no
muro de suporte do morro da Igreja do Bonfim, esquecida entre expositores de
publicidade e a vegetação que cresce nas juntas do paredão. Terá sido
inicialmente instalada na Rua do Godim, antiga Rua da Prata, muito próximo da
estrada que seguia para Valongo, hoje Rua do Bonfim. Dela apenas resta a
passagem da sua bica da qual ainda se pode ver um pedaço do tubo de aço, e um
pilarete para colocação do vasilhame que se enchia de água. O que era ferro
desapareceu pela ação do vandalismo que tem atacado as fontes e chafarizes do
Porto. Bahia Júnior, 1909, descreve o Charco de Godim situado ”ao fim da rua do mesmo nome, dentro de um
dique de pedra e terra colocado no encontro das duas ruas que aqui se juntam,
ambas de declive muito rápido”. Este dique retinha a água por vezes
debitada pela mina e a água que escorria, quando chovia, das duas ruas.
Facilmente se depreende que a água do charco era de muito má qualidade, mas os
habitantes da área não tinham outra alternativa. Pela fotografia que
reproduzimos depreende-se que o charco nada tem a ver com a Fonte da Rua da Prata.
Figura
7 – A simplicidade da Fonte da Prata adaptava-se à
sua função, servir os que passavam
Figura 8 - O dique do charco de Godim, seco quando da visita de J. Bahia Júnior.
Foto da sua dissertação, na pág. 49
A Fonte da
Lomba, situada na rua do mesmo nome que liga a Rua do Heroísmo à Rua de
Pinto Bessa, é descrita por J. Bahia Júnior. A água que a abastecia a sua bica
nascia a cerca de 25 m da fonte, no meio de um campo cultivado. Da bica, a água
caía numa pia donde seguia por uma caleira que a conduzia ao tanque lavadouro. A
qualidade bacteriológica da água da mina e da fonte era considerada como boa,
exceto quando chovia porque sofria o efeito das contaminações (Bahia Júnior,
1909:103).
Figura 9 - Fonte da Lomba. J. Bahia Júnior, pág. 48
Velasques faz referência à Fonte da Boavista que terá sido
localizada na Rua das Antas, recebendo a água da Quinta do Fojo (Velasques, 1991:
191). Infelizmente, não encontrámos outra referência a essa fonte e muito menos
à Quinta do Fojo, próximo da Rua das Antes. A mais próxima chamou-se de Quinta
das Lameiras que hoje é o Parque de São Roque.
Paranhos e a água
Paranhos é conhecida, pelo menos desde o século X. A
freguesia de S. Veríssimo de Paranhos fez parte da Terra da Maia (Marçal, 1954:
1)[2].
Era um conjunto de casais dispersos, com alguns caminhos que convergiam para as
portas da cidade do Porto. Dois deles eram muito importantes: a estrada para
Guimarães, que saía da Porta dos Carros e passava pela Rua do Bonjardim, e
lugares da Aguardente (Praça do Marques de Pombal) e da Cruz da Regateira, lugar
que existia na área onde foi construído o Hospital Conde Ferreira, inaugurado
em 1883; da Porta do Olival, seguia-se para o Sério (Rua Antero de Quental),
pela Rua de Santo Ovídio (depois Rua da Sovela e, hoje, Mártires da Liberdade),
ou para o Carvalhido, pela Rua de Cedofeita. O primeiro caminho dirigia-se para
Braga, enquanto o segundo seguia para Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Viana do
Castelo (Marçal, 1954: 2).
Com o desenvolvimento do burgo do Porto, no século XVII a
sua população teve que procurar pouso fora dos muros da cidade, começando a
surgir quintas e prédios ao longo das estradas que se iam formando. Na sequência
da incorporação no concelho do Porto, em 1836, das freguesias de Campanhã,
Lordelo do Ouro e S. João da Foz do Douro, a Câmara Municipal do Porto
apresentou ao Governo um pedido para que a freguesia de S. Veríssimo de
Paranhos fosse anexada à cidade, o que aconteceu em setembro de 1837. Em finais
do século XIX, a freguesia de Paranhos mostra um crescimento lento, no qual se
distingue a abertura de duas importante ruas: a da Rainha, atual Antero de Quental e Vale
Formoso, e a de Costa Cabral, que seguem as antigas vias de acesso,
respetivamente, a Braga e a Guimarães.
No início do século XX, Paranhos era um aprazível local dos arrabaldes da
cidade do Porto, onde existiam belas quintas e casas de habitação. O seu fértil
terreno permitia o cultivo de muitos géneros agrícolas, fazendo que as casas de
lavoura fossem durante mais algumas décadas a mais importante atividade
económica da freguesia. Entretanto, a indústria começou a ganhar alguma
importância com a fundação de algumas fábricas de tecidos, curtumes, etc., mas
nunca teve a expressão que foi sentida na freguesia de Bonfim.
Atualmente, a freguesia de Paranhos com 6,7 km2
de área, é limitada, a nascente, por Campanhã, a sul, por Bonfim, Santo
Ildefonso e Cedofeita, a oeste, por Ramalde, e a norte fazendo fronteira com as
freguesias de S. Mamede de Infesta (Matosinhos), Pedrouços (Maia) e Rio Tinto (Gondomar).
No ano de 1623 a freguesia de Paranhos tinha 246 habitantes, passando, em 1867,
para 466 almas de confissão, segundo as Constituições
Sinoidais do Bispado, citadas por Marçal, 1954: 58. Em 1864 apenas era de
3.309 habitantes. Tinha, pelo Censo de 1950, 37.507 habitantes. Em 1991 tinha
50 906, em 2001 48 686 e, em 2011, 44 247, sendo a freguesia mais populosa do
Porto.
Depois de Paranhos ter ganho, em 1883, um hospital, o de
Conde Ferreira, nos primeiros anos da década de 1950 construiu-se no Lugar da
Asprela aquele que começou por ser o Hospital Escolar da Cidade, com a
Faculdade de Medicina virada para a Estrada da Circunvalação. Hoje, aquela área
está ocupada com importantes unidades de ensino superior e instituições hospitalares.
Entre estudantes, professores, técnicos de saúde, doentes e visitantes, para ali
se deslocam diariamente mais do que 50.000 pessoas.
Figura 10 - O território da freguesia de
Paranhos. Fonte: Junta de Freguesia de Paranhos, mapa descarregado em
18/11/2018 de https://goo.gl/a5bniE
A freguesia de Paranhos é rica em água que se acumula,
devido à orografia, nas suas profundezas, destacando-se os importantes
mananciais de Paranhos e Salgueiros, que foram descritos na Parte 9, cujos
aquedutos transportavam a sua água para o centro da urbe. Paranhos possui
alguns regatos de pequena dimensão utilizados outrora pelos lavradores para
regarem os seus terrenos de cultivo, pois esta freguesia, no século XIX e
inícios do século XX era essencialmente uma terra de cariz rural. Horácio Marçal
caracteriza hidrograficamente a freguesia de Paranhos, começando por afirmar
que ela, “em rigor, não tem rios ou
afluentes, muito embora chame rios a alguns regatos que possui, os mais
conhecidos são o das Barrocas, o da Azenha, o da Manga e o da Travessa”
(Marçal, 1954: 26-27). Os nomes destes “regatos” não correspondem aos
atualmente conhecidos. A Ribeira da Manga, que corresponde à Ribeira da Asprela, resulta da reunião
do Rego de Consortes, que pode equivaler à Ribeira de Outeiro, com o da Azenha,
que pode ser a Ribeira da Areosa. O regato das Barrocas deve corresponder a um
dos riachos, o que nasce na rua da Fonte do Outeiro, que origina a Ribeira do
Outeiro. Não encontrámos qualquer informação sobre a localização dos regatos da
Azenha e Travessa. Podemos admitir que a construção dos edifícios escolares e
hospitalares que ocupam o espaço entre os lugares da Azenha e Asprela
modificaram o percurso dos regatos registados por Horácio Marçal. Caso
semelhante ocorre durante a instalação da linha Amarela do Metro do Porto. Segundo
Marçal, 1954, os ribeiros mais conhecidos foram os das Barrocas, o da Azenha, o
da Manga e o da Travessa. Num documento do século XI, reproduzido por Horácio
Marçal, 1954: 27, fazia-se referência ao Rio Paramio que não terá sido nenhum
dos atrás referidos.
A da Ribeira dos Currais, afluente do Rio Tinto, tem a sua
nascente, nas alturas de Currais (monte dos Murganhos) e do monte das Antas, e
parte do seu percurso na freguesia de Paranhos. O mesmo acontece com a Ribeiro
de Picoutos e a Ribeira dos Amores. O de Picoutos nasce junto à Igreja dos
Capuchinhos, no Amial, atravessa a Estrada da Circunvalação e segue para se
encontrar com o Rio Leça. A ribeira dos Amores
nasce na freguesia de Paranhos e segue em direção ao concelho da Maia.
Afluente do Rio Leça, esta ribeira tem uma extensão de, aproximadamente, 790 m
no concelho do Porto, encontrando-se, neste troço, totalmente entubada.
A ribeira da Asprela, também afluente do Rio Leça, tem
vários afluentes que nascem no concelho do Porto, na freguesia de Paranhos.
Esta linha de água apresenta, na cidade do Porto, uma extensão de
aproximadamente 3,7 km (Fernandes, 2009: 28). A ribeira da Asprela encontra-se
maioritariamente entubada, com apenas 36% a céu aberto. Uma das primeiras ações
de reabilitação de linhas de água da cidade do Porto ocorreu num troço do
ribeiro do Outeiro junto do Bairro do Outeiro. Em 2014, a Universidade do Porto
deu início ao desentubamento e reabilitação de um troço entre as Faculdades de
Engenharia e Economia. Está previsto o desentubamento e reabilitação de um
troço da ribeira da Asprela junto do Instituto Português de Oncologia (IPO), o
que aconteceu, até 2018, num pequeno troço.
A ribeira da Asprela resulta da reunião de quatro linhas de
água, a saber:
1.
Ribeira da Areosa – segundo Neves, 2009: 31, esta ribeira nasce a
nascente da auto-estrada A3, na zona da Escola E/B 2/3 da Areosa e traseiras da
Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP). É importante para
recolher as águas pluviais que drenam da A3, FEUP e outras instalações. Esta
ribeira percorre um canal em betão, em parte aberto, localizado entra a FEUP e
a Faculdade de Economia, encontrando-se a céu aberto depois de atravessar a rua
Dr. Roberto Frias e até à sua junção com o Ribeiro do Outeiro, nas traseiras da
Faculdade do Desporto da Universidade do Porto. Em 2001, as seis amostras
recolhidas por Paula Reis, entre julho e outubro, no troço imediatamente antes
daquela sua reunião, apresentavam valores da CQO entre 15 e 93 mg/L O2 (Reis,
2002). Os resultados mostram que esta a ribeira está contaminada, mas numa
escala inferior à da maior parte das linhas de água do Porto. Mesmo assim, a
sua água foi classificada como má pelo Índice de Qualidade Geral.
Figura 11 – A Ribeira da Areosa, num período seco
(2018), no percurso ao lado da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto
Figura 12 – A Ribeira da Areosa, num período de
chuva (Janeiro de 2019), no mesmo percurso
2.
Ribeira do Outeiro – este curso de água resulta da reunião de dois
riachos, um dos quais nasce na rua Fonte do Outeiro, nas traseiras do Hospital
Conde Ferreira, atravessa a A3 e junta-se ao outro riacho que nasce a sul da
Via de Cintura Interna, VCI,I na rua Dr. Pires de Lima, segue canalizada ao
longo das Ruas Augusto Lessa, Vitorino Damásio e Luís Woodhouse, caindo num
lavadouro público e daí seguindo em aqueduto ao encontro da ribeira do Outeiro.
Na entrada deste aqueduto chegam dois tubos de razoável dimensão com águas
aparentemente residuais, cuja origem desconhecemos. Esta ribeira junta-se à da
Areosa depois de atravessar a rua Dr. Roberto Frias, dando origem à ribeira da
Asprela. O estudo realizado por Paula Reis permite verificar que esta linha de
água apresentava uma carga poluidora semelhante à da ribeira da Areosa, tendo
sido classificada como de má qualidade.
Figura 14 – Aqueduto do ramo sul da Ribeira de
Outeiro que atravessa a VCI. Dois tubos de importante diâmetro alimentam o
mesmo aqueduto. Sublinhe-se que o dia em que se realizou a foto foi antecedido
por um largo período sem chuva. A descarga do tubo da direita, semelhante à do
tubo da esquerda, tem características físicas que merece uma pergunta: qual é a
sua origem?
Figura 15 – Percurso do ramo norte da VCI da
Ribeira de Outeiro
3.
Ribeira de Paranhos – nasce na rua de Augusto Lessa, abastece o
lavadouro público situado nas traseiras da Escola Preparatória de Paranhos, e
segue, canalizada, em direção à Faculdade de Medicina Dentária. Após esta
instituição, desagua na ribeira da Asprela. Em 2001, a água desta ribeira, com
valores da CQO entre 163 e 499 mg/L O2, era equivalente a esgoto
doméstico (Reis, 2002). A autora classificou a água deste ribeiro como
má/péssima.
Figura 16 – Reunião do Ribeiro do Outeiro com a
da Areosa
Figura 17 – A Ribeira da Asprela nas traseiras da
Faculdade do Desporto da Universidade do Porto
Depois de receber as três ribeiras atrás descritas, forma-se
a ribeira da Asprela. Embora no troço que rodeia a Faculdade do Desporto
(FADEUP) a ribeira não esteja coberta por betão ou material equivalente, a
vegetação é tão intensa e densa que ela não se vê facilmente. Depois de
atravessar a Rua de Roberto Frias, a ribeira passa, entubada, no Instituto
Superior de Engenharia e Universidade Portucalense, e sai nas traseiras do
Instituto de Oncologia onde vê o Sol e as Estrelas em poucas dezenas de metros.
Regressa ao subsolo que foi ocupado por mais um conjunto de prédios de
habitação até atravessar a Estrada da Circunvalação. A partir daí, segue em
canal aberto em direção ao Rio Leça. Já acima foi referido que as ribeiras da
Areosa e do Outeiro mostravam, em 2002, contaminação com águas residuais. Esta
situação mantém-se na Ribeira da Asprela. O estudo realizado, em 2007, por
Nívea Vieira (Vieira, 2007: 91-93) comprova que a contaminação era de origem
doméstica, como o confirmam as concentrações de nitratos, nitritos e azoto
amoniacal.
Figura 18 – A Ribeira da Asprela nas traseiras da Faculdade do Desporto da Universidade do Porto
Figura 19 – A Ribeira da Asprela nas traseiras do
Instituto Português de Oncologia
Figura 20 – A Ribeira da Asprela, depois da
Estrada da Circunvalação, despedindo-se do Porto e correndo para abraçar o Rio
Leça
Para além dos mananciais de Paranhos e
Salgueiros que abasteceram a cidade através de muitas fontes descritas no
capítulo 9, a freguesia de Paranhos possuía também o manancial do Marques de
Pombal que alimentou as fontes da Rua da Alegria e a Fonte Seca da Rua de Santa
Catarina. A primeira fonte pertencia aos Padres Congregados do Oratório de S.
Filipe. A segunda era assim chamada porque foi reconstruída no lugar onde
existiu outra que ficou sem água durante mitos anos até 1852. A Fonte da Rua da Alegria é referida
atrás por ter pertencido à freguesia do Bonfim.
Segundo Souza Reys, a freguesia de
Paranhos tinha água abundante e de excelente, qualidade, sem que se pudesse
separar alguma por ser sofrível ou má, era abastecida por dez fontes, poços e
cisternas públicas. Os poços eram três, um na aldeia de Lamas, a Fonte
ou Poço da Aldeia de Lamas, outro chamado de Fonte da Bouça, e um outro localizado
na Cruz da Regateira (Souza Reys, 1984: 198). Este autor apenas considerava
cinco fontes: do Outeiro, do Salgueiral, do Vale e da Manga: Horácio Marçal,
1968 acrescentava àquela lista as Fontes de Baixo, da Aldeia de Lamas, da
Travessa, da Cruz da Regateira, que pode ser o poço referido por Souza Reys, e a
das Barrocas. Com exceção desta última, que tinha duas bicas, todas as
restantes não passavam de cisternas onde a água fresca e saborosa era colhida
pelo processo de mergulho de cântaros, e de poços ou comuns. As vertentes da
maioria delas corriam para os campos dos lavradores vizinhos e abasteciam
também alguns lavadouros.
A
Fonte das Barrocas tinha duas bicas. Provavelmente, localizar-se-ia próximo
da rua de Costa Cabral, a norte do Hospital Conde Ferreira, na rua ou travessa
das Barrocas. A Fonte do Vale, no
lugar do Vale (Velasques, 1991: 230) e a Fonte
do Outeiro e respetiva cisterna localizavam-se na rua que recebeu o nome da
fonte. Para além desta cisterna existiam mais quatro na freguesia de Paranhos: Fonte de Baixo, Fonte do Salgueiral, Fonte
do Vale e Fonte da Manga no
lugar da Manga. A Fonte da
Manga, que deu o seu nome ao Lugar da Fonte e ao Casal da Fonte foi, em 1593,
registada nos bens pertencentes ao Cabido. Horácio Marçal acrescenta a esta lista
a Fonte/cisterna
de Baixo, no Lugar de Baixo
e o Poço da Cruz da Regateira, no
lugar do mesmo nome, onde a população se abastecia. A água provinha do
manancial de Paranhos (Marçal, 1954: 49:51, Marçal, 1968; 22, Souza Reys, 1984:
198, Velasques, 1991: 211 - 218)(Velasques,
1991: 201).
Figura 21 – O fontanário da Rua da Fonte do
Outeiro, alimentado com água da companhia. Ele substituiu a fonte que deu nome
à rua
Nesta freguesia havia uma nascente que alimentava uma fonte
de bica, e os seus lavadouros, de nome Fonte
da Azenha (Souza Reys, 1984: 198). Horácio
Marçal teve sérias dúvidas que a água desta fonte tenha corrido por uma bica.
Velasques localizou-a na rua da Azenha, que une a rua do Amial à de S. Tomé. Existia
outra nascente que formava um rego volumoso cuja água era usada para uso
doméstico dos habitantes próximos e que se chamava Fonte da Travessa. Este rego também alimentava os lavadouros da rua
da Travessa (Souza Reys, 1984: 198, Velasques, 1991: 226). A Fonte da Bica
Velha foi construída em 1718 na Travessa da Bica Velha. Em 1896 foi transladada
para a Rua da Nataria, adotando, então, este nome (Velasques, 1991: 189). Na
área Quinta do Covelo, construída no século XVIII e há muitos anos em ruínas,
existiu uma fonte denominada do Covelo na Revisão do PDM de 2018[3]
que está descrita num documento de 1440. A Fonte
das Fressureiras, apresentava água de boa qualidade bacteriológica em 1905
(Bahia Júnior, 1909: 24). O mesmo autor encontrou-a seca na avaliação que fez
em 2008.
Continua...
[1] Pinto, Jorge Ricardo, 2012, A expansão
(sub)urbana no Porto romântico. O caso da Freguesia do Bonfim, Percursos &
Ideias, n.º 3&4 – 2.ª Série, 2011-2012.
[2] Marçal, 1954, H., S. Veríssimo de Paranhos (freguesia da cidade do Porto) – Subsídios
para a sua monografia, Documentos e Memórias para a História do Porto –
XXV, Publicação do Gabinete de História da Cidade da Câmara Municipal do Porto.
[3] Revisão do Plano Diretor Municipal do
Porto, 2018, Valores Patrimoniais – Mobiliário Urbano e Obras de Arte Pública,
Relatório de Caracterização e Diagnóstico, Câmara Municipal do Porto.
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